Andamos há quase duas décadas a falar de imigração e do Mediterrâneo se ter tornado num cemitério onde diariamente se afogam 10 pessoas. No início desta semana, ficou demonstrado que tudo pode piorar quando menos se espera e que a tempestade perfeita pode ainda estar para chegar. Não é novidade que, entre Espanha e Marrocos – ou entre a Grécia e a Turquia, ou entre a Líbia e a Itália – a história se conjuga de forma imperfeita. A avalanche humana que entrou na praia do Tarajal, em Ceuta, e cujas imagens correm mundo é o resultado de um mesquinho incidente diplomático que opõe os governos de Madrid e de Rabat. A 20 de abril, um indivíduo de 72 anos, com passaporte argelino e com o nome de Mohamed Benbatouch, deu entrada nos cuidados intensivos do hospital de San Pedro de Logroño, vítima de covid-19 ou talvez cancro no pâncreas, mas o seu estado de saúde é aqui irrelevante. Sucede que o doente em causa é Brahim Gali, um dos grandes inimigos de Marrocos por ser o presidente da autoproclamada República Árabe Sarauí Democrática. Ou seja, é o líder da Frente Polisário, o movimento que luta pela independência do Sahara Ocidental desde 1975, ano em que a Espanha abandonou essa sua colónia e o reino alauita a anexou à revelia da comunidade internacional. Indignado por Espanha acolher agora uma figura que classifica como terrorista, o Executivo marroquino decidiu retaliar e nem lhe interessou as explicações de que o curtido e polémico comandante Gali fora aceite por “razões humanitárias”. Na última terça-feira, a embaixadora do país magrebino, Karina Benyaich, foi muito clara: “Há atos que têm consequências”.
VISÃO DO DIA: A nova conquista de Ceuta
Mais na Visão
Parceria TIN/Público
A Trust in News e o Público estabeleceram uma parceria para partilha de conteúdos informativos nos respetivos sites