Enquanto fala, ao telefone, após mais um dia de trabalho, Gonçalo entusiasma-se enquanto fala dos progressos da bebé, mas o brilho da voz não tarda a esbater-se, dando lugar à angústia: “Estamos gratos por tudo o que têm feito por nós mas, se a menina permanecer nesta clínica por um, dois meses, quando os media já não falarem de nós, o que pode acontecer?”
Um receio legítimo, num país onde os emigrantes não têm direito a licença de paternidade nem proteção social. De resto, a questão das seguradoras e como cobrem (ou não) situações imprevistas, como a da Margarida, transcende os Emirados Árabes Unidos (EAU). Por acaso ou coincidência, as autoridades de saúde do Dubai estão a equacionar a introdução de novas medidas, para vigorar em Junho de 2016: a ideia é que os pacotes de seguros negociados com as entidades empregadoras incluam obrigatoriamente, para todos os residentes, a assistência médica até 34 mil euros e durante um mês, a recém-nascidos com menos de 36 semanas de gestação.
Mesmo assim, a medida não resolveria situações mais complicadas, como aquela em que o casal de emigrantes portugueses se encontra, passível de acontecer a qualquer cidadão expatriado. “Não somos só primeiros nem seremos os últimos a ver recusada a assistência médica a bébés prematuros, por parte das seguradoras”, esclarece Gonçalo Queiroz. E acrescenta: “Nós temos o pacote de seguro básico negociado com a empresa, se não o tivéssemos, ficaria a 2 mil euros por pessoa; a diária da Margarida está a custar 900 euros, em média, além dos tratamentos, 500 pela transfusão de sangue, mais 500 pelo ventilador…”
Marido e mulher prosseguem com as contas de cabeça: dez mil euros pagaram a cesariana e o internamento da mãe, 50 mil foram já gastos com a filha, os restantes 50 mil terão o mesmo destino e o tempo continua a passar. Os donativos continuam a chegar à conta bancária divulgada na página oficial do Facebook e as iniciativas de ajuda continuam a surgir (como o espetáculo com danças para angariação de fundos, no final do mês, em Évora, promovido pela associação onde Eugénia dava aulas de dança), mas o seu alcance pode ser, no cenário atual, limitado.
O aumento de peso da menina (480 gramas, na última foto partilhada na rede social) não afasta os receios de complicações. Atualmente, a pequena Gui está a soro e pode vir a ter de ser submetida a cirurgia ao intestino. A tão aguardada vaga no hospital Latifah, onde as despesas com a diária incluem alguns tratamentos e são menos onerosas, tarda em chegar.
A questão que se coloca agora é se será preciso um pedido formal de apoio às autoridades portuguesas, se continuar a não ser clinicamente a transferência para Portugal (em aeronave da Força Aérea, que requer quatro a cinco dias a preparar, para garantir as condições exigidas). A este propósito, o Secretário de Estado das Comunidades, José Cesário, admite que a ajuda financeira será possível, desde que o casal comprove que não tem condições financeiras – nem os familiares e ascendentes diretos – para manter a criança hospitalizada no Dubai. “O que me preocupa é que a criança terá necessidade de ser acompanhada por muito tempo e não vai ter qualquer seguro que o garanta”, avisa, acrescentando que ainda não teve qualquer contacto da família neste sentido.