Na semana passada, num supermercado, uma senhora com alguma idade pediu-me para lhe comprar duas laranjas. Acedi imediatamente ao pedido. Mas fi-lo primeiramente pela perplexidade do pedido mais do que pelo ato solidário. Aquela pessoa não podia comprar duas laranjas.
Quando era criança, plantei árvores de frutos no meu quintal nos Açores. Apesar de saber que se comprava fruta, também a plantei. Por vezes, ia à fruta no quintal do meu vizinho. Como criança, não percebia bem o conceito de propriedade privada da fruta.
Quando penso no episódio desta senhora que não pode comprar laranjas e quando recordo a facilidade com que a fruta nasce e pode ser colhida, sinto profundamente a pobreza em que nos encontramos e que não permite a uma pessoa comprar duas laranjas ou colher duas laranjas de uma qualquer árvore. Porém, no fim do dia, muita da fruta do supermercado irá para o lixo.
Neste “jogo” do que uma pessoa precisa mas não pode ter, tiram-nos a capacidade de subsistir e com isto centenas de milhares de pessoas estão a passar fome em Portugal. Outros milhões no mundo. Mais pobres e com mais fome, este é um dos dramas em que nos encontramos. Sinto-me simplesmente triste com isto.
A solução passará por mudanças profundas de como olhamos para o mundo, como olhamos os nossos semelhantes e de como iremos considerar de futuro o acesso a algo tão básico como a alimentação. Neste momento, e como indivíduos, talvez possamos apoiar o nosso vizinho, criar alternativas locais de economia social e solidária e perceber que não é normal alguém ter fome. É importante que não se torne normal! Não deixem de apoiar o vosso vizinho e as instituições de solidariedade social.
Por último, não se esqueçam que é, por vezes, humilhante estar no lado de quem recebe apoio. Também temos que aprender a ajudar sem magoar.