Sobre a imigração, a União Europeia publicou uma inaceitável legislação porque demasiadamente “seletiva” para a captação da massa cinzenta de quadros: médicos, enfermeiros, informáticos, engenheiros… Essa política terá como consequência imediata uma sangria desses quadros em países já de si muito depauperados em recursos humanos formados, o que evidentemente acentuará a sua já hipotecada hipótese de desenvolvimento.
É neste restritivo contexto que muralhas se vão erguendo, fechando enormes populações em guetos globais e transformando alguns países e regiões em fortalezas, e contribuindo para a morte de milhares de pessoas, em naufrágios e travessias de desertos.
Nunca se construíram tantos muros e vedações infames. Desde a demolição do muro de Berlim, de que guardo preciosamente dois pedaços, multiplicaram-se as muralhas entre territórios espanhóis em África e Marrocos, entre Israel e a Palestina, entre os EUA e o México, entre… Regressámos aos tempos da muralha da China que pretendia impedir, sem sucesso, a invasão dos “bárbaros” mongóis, prova de que ainda não aprendemos nada ou aprendemos bem pouco! Não há muralha nem arame farpado que impeça a passagem a multidões em movimento! Sempre assim foi, sempre assim será.
E o facto é que:
– A Europa envelhecida (estima-se que em 2060, cerca de 30% da população europeia tenha 60 anos ou mais), sem verdadeiras e eficazes políticas demográficas, precisa de sangue novo e de força laboral;
– Com o subdesenvolvimento crónico da África Subsaariana, com elevadas taxas de desemprego (de 50% – Senegal a 95 % – Zimbabué), se excluirmos os biscates da economia informal, de pura sobrevivência, os jovens desesperados, sem cunhas políticas nem padrinhos que os possam colocar no tentacular, embora mísero, funcionalismo público, estão dispostos a tudo para chegar até nós: atravessar o Atlântico ou o Deserto do Saara! Calcula-se que, por ano, morram uns milhares na travessia marítima e na travessia saariana. África está em movimento para Norte, cheia de ilusória esperança! Roger Bovin, antigo presidente da OCDE, previa há uns 10 anos, numa conferência em Washington, que assistiríamos por volta de 2025 / 2030, ao surgimento de uma onda migratória gigantesca do Sul para o Norte, como nunca antes vista na Humanidade, porque, segundo ele, a África negra colocaria mais jovens no mercado de trabalho do que os EUA, Canadá, Japão, União Europeia e Rússia em conjunto!
– Os imigrantes (à semelhança dos cerca de 400.000 huguenotes franceses, que fugiram às guerras de religião em França nos séculos XVI e XVII para a Holanda, Alemanha, Suíça, América, Inglaterra e a Cidade do Cabo, ou dos portugueses que se dispersaram pelo Mundo, como continuam aliás a fazer, melhorando substancialmente o nosso índice de desemprego, ou dos africanos, brasileiros e europeus de leste que chegaram até nós) são sempre fonte de enriquecimento económico, cultural e social! Os imigrantes, em Portugal, apesar de representarem menos de 5%* da população, constituem cerca de 3%* da população ativa e contribuem para 6%*** do PIB nacional, com tendência para aumentar à medida que forem adquirindo melhores qualificações e melhores ordenados… contribuem, ainda, para mais de 4%** da Segurança Social, porque muitas redes sanguessugas só os empregam clandestinamente. De salientar que os imigrantes em Portugal recebem apenas 0,4 %** das pensões pagas! São, por isso, contribuintes líquidos para o nosso Estado, como também para os outros. É por isso tempo de acabar com falácias xenófobas e ignorantes que em nada contribuem para a desejada pacificação e harmonia social entre nós.
– A migração é um direito humano básico. Só emigra do seu país, deixando tudo para trás, quem não tem alternativa, seja por razões económicas, de segurança e, muito em breve, climáticas. Nós, portugueses, sabemo-lo bem, porque fomos, e continuamos a ser, um povo emigrante. Calcula-se que o número de pessoas que decidiu abandonar Portugal mais do que quadruplicou, comparando com o ano de 2001. Em 2012, contavam-se cerca de 120.000 emigrantes.
– Se a migração representa um ganho multifacetado para os países de acolhimento, também é uma mais-valia financeira para os países de origem. Portugal também o sabe, ou deveria saber: após a nossa adesão à então Comunidade Económica Europeia, as remessas dos nossos emigrantes para Portugal, durante muitos anos, eram iguais ou superiores aos fundos que vinham de Bruxelas.
– Com os cerca de 40 milhões de refugiados e deslocados no Mundo, e com as alterações climáticas à porta, que provocarão muitas mais dezenas de milhões de refugiados e deslocados, o movimento migratório vai tomar uma amplitude ainda maior: criem-se pois, desde já, as condições (educacionais, legislativas, urbanísticas…) para se poder fazer face a esse facto e evitarmos proximamente choques culturais violentos.
– O milkshake, a mistura, a miscigenação da população mundial está em curso, em aceleração e não há volta a dar. É um novo paradigma civilizacional!
Já hoje, nas escolas portuguesas, onde vou falar com relativa frequência, há 15, 20, 25 …. Nacionalidades! No meu tempo, nas escolas, só havia portugueses…
Daqui a 30 anos, haverá 50 ou 60! É também isso a maravilhosa globalização social, cultural, multiétnica!
– Os EUA, em 2013, tinham 14,3% de imigrantes na sua população. O Luxemburgo tinha 43,3%, sendo uma parte muito significativa portuguesa, a Suíça 28,9%, o Canadá 20,7%, a Alemanha 11,9%…
Talvez isso também ajude a explicar o seu dinamismo económico…
– Não há assim razão para nós, portugueses, recearmos os outros. Nós, que tão bem soubemos miscigenar-nos (não há nenhum português nem nenhum povo de “sangue puro”), desde o contacto com os celtas há mais de 2000 anos, passando por romanos, vândalos, suevos, visigodos, mouros/marroquinos e mauritanos, africanos, orientais, sul-americanos… Nós, os portugueses, os iniciadores da verdadeira globalização planetária (racial, cultural, linguística, botânica, culinária…) nada devemos temer!
As migrações internacionais são para uns um grande desafio e para alguns outros, infelizmente, uma grande ameaça…
Façamos das migrações uma enorme oportunidade para a Paz no Mundo e para o combate à pobreza, essa sim, uma grande ameaça global.
*Dados de 2012
**Dados de 2011
***Dados de 2009