Depois do fentanil, o opiáceo responsável por cerca de 100 mil mortes nos Estados Unidos em 2022, há outra droga a alarmar as autoridades. Esta, para além de provocar um profundo estado de alienação, resulta na necrose da pele. Úlceras e abcessos irrompem na pele dos consumidores numa crosta escamosa que, se não for tratada, pode levar à amputação do membro afetado. “Agora há buracos nas minhas pernas e nos meus pés”, conta Sam, de 28 anos à Sky News.
O “Tranq”, como é conhecido nas ruas dos EUA, ou “anestesia de cavalo”, em Porto Rico, é uma mistura de xilazina e fentanil. O propósito desta mistura injetável é o possível prolongamento dos efeitos sedativos. A xilazina, um tranquilizante veterinário utilizado em gado, afeta o sistema nervoso central causando sonolência, amnésia e uma baixa na frequência cardíaca e na pressão arterial. Já o fentanil é um analgésico, que, quando utilizado indevidamente, induz um estado de euforia. A toma de opiáceos em combinação com xilazina e outros depressores do sistema nervoso central, como o álcool ou antidepressivos, aumenta significativamente o risco de overdose.
Sam menciona ainda que os centros de reabilitação não estão a conseguir combater a crise provocada pelo consumo de xilazina: “Estes lugares não desintoxicam para o tranq porque não estão a conseguir acompanhar a evolução dos acontecimentos”.
“Estive limpa durante oito anos. Depois tive uma recaída há dois anos. Estava a trabalhar num centro de reabilitação quando um cliente masculino, que era obcecado por mim, invadiu o meu apartamento e tentou matar-me”, descreve Danielle ao site da estação britânica, que publicou recentemente uma grande reportagem sobre o tema.
“Eu preciso de ser preso ou colocado num centro de reabilitação bem longe de Kensington. Preciso apenas de sair daqui. Este lugar destrói tudo o que há de bom”, relata, por seu lado, Zach, um veterano da Guerra no Iraque.
Kensington é considerado um dos bairros mais perigosos de Filadélfia. “Vêem-se aqui pessoas que são como uma concha. Estão a viver a sua vida dois minutos de cada vez porque é só isso que importa.”, observa Sam. “Já fui ameaçada com facas no comboio. Ontem, estive a chorar o dia todo. Não tenho ideia do que fazer.”, queixa-se Danielle.
O uso de xilazina nos Estados Unidos estava geralmente limitado a Porto Rico, porém, nos últimos anos, Filadélfia, no estado da Pensilvânia, é o epicentro do consumo desta substância – mais de 90% das substâncias ilegais testadas em 2021 continham o tranquilizante.
A utilização alargada da xilazina pode ter sido impulsionada, em parte, pelo seu baixo custo e pela fraca aplicação da lei, uma vez que não é uma substância controlada em humanos. Assim, é difícil de avaliar com certeza a amplitude do uso de xilazina ou o verdadeiro número de overdoses. O aparecimento da xilazina como droga recreativa nos Estados Unidos parece seguir o mesmo caminho que o fentanil, começando no nordeste, com alastramento ao sul, e só depois a oeste.
Médicos e investigadores afirmam ser necessária uma mudança de abordagem para responder à crescente prevalência da xilazina nas drogas de rua. Ainda não existem testes rápidos como as tiras de deteção do fentanil. Embora profissionais de saúde sublinhem que substâncias como a naloxona são eficazes para combater os opiáceos em overdoses de misturas de drogas, estas não revertem os efeitos da xilazina. Devido a isso, alguns especialistas advogam a criação locais de consumo supervisionado de forma a estudar o efeito da xilazina em humanos.
O abuso de álcool e drogas são grandes desafios de saúde pública nos Estados Unidos. Recentemente, contabilizaram-se mais de 2,7 milhões de cidadãos americanos que consomem drogas ilícitas ou usam medicamentos sujeitos a receita médica indevidamente.