O Ministério Público defende que João Carreira, o estudante acusado de planear um ataque terrorista na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa deve ser condenado por um crime treino para o terrorismo, numa pena não inferior a três anos e seis meses de cadeia, a ser cumprida num hospital prisional, e não por detenção de arma proibida.
De acordo com o recurso, o Ministério Público entende que a decisão do tribunal coletivo encerra, em si, uma contradição, uma vez que deu como provados todos os factos que encaixam no crime de treino para terrorismo, mas não condenou o jovem por esse crime.
“Dos factos dados como provados (…), resulta que o arguido se muniu de conhecimentos com vista à execução de crimes de homicídio, ofensa à integridade física e incêndios, explosões e outras condutas especialmente perigosas, autoministrou treino e adquiriu material para aqueles efeitos”, refere o MP.
Em dezembro do ano passado, um coletivo de juízes presidido por Nuno Costa condenou João Carreira a dois anos e nove meses de prisão, a cumprir num estabelecimento prisional para inimputáveis, apenas pelo crime de detenção de arma proibida. O tribunal entendeu absolver o arguido dos crimes de terrorismo, considerando que estes só se verificariam, por um lado, caso os atos fossem repetidos, mas como o próprio João Carreira afirmou que pretendia suicidar-se, “o plano dele esgotava-se na atuação que ia levar a cabo com o suicídio”, declarou o juiz presidente no dia da leitura do acórdão. Por outro, decidiu o tribunal, João Carreira não tinha nenhuma motivação ideológica, nem fazia parte de um qualquer grupo terrorista, como o Estado Islâmico.
“A circunstância de se ter dado como provado que o arguido agiu isoladamente, que não estava inserido num grupo que professe a prática de atos terroristas por uma qualquer motivação ideológica e que pretendia suicidar-se em ato contínuo às mortes e ferimentos que pretendia causar na Universidade, não possibilita concluir que essa conduta não era apta a causar um sentimento de pavor e terror na comunidade”, contrapõe o MP no recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa.
Em tribunal, recorde-se, João Carreira declarou: “Queria depois do ataque cometer um suicídio. Queria esfaquear-me na barriga. Foi inspirado num vídeo jogo. A pessoa espeta a faca na barriga e morre.”O jovem afirmou ter começado a idealizar o plano de ataque na universidade em janeiro de 2022. “Atribuo essa ideia ao facto de ter tido covid-19 e uma depressão, de estar em Lisboa a viver e de querer chamar a atenção das pessoas da comunidade.” Mas garantiu: “Não pretendia atingir ninguém em especial”, respondeu ao juiz quando lhe perguntou se ele pretendia atacar um professor ou um colega em específico. Esta aleatoriedade do ataque é também um argumento utilizado pelo MP para defender a condenação pelo crime de treino para terrorismo.
Entretanto, segundo informações recolhidas pela VISÃO, a defesa de Jorge Carreira recorreu da condenação a dois anos e nove meses de pena efetiva. Jorge Pracana alegou que, não tendo o arguido quaisquer antecedentes criminais, a pena deve passar de efetiva a suspensa.