Dois crimes de corrupção passiva, um de branqueamento de capitais e outro de fraude fiscal. É esta a conta final apresenta a Manuel Pinho, antigo ministro da Economia, pelo Ministério Público na acusação desta quinta-feira. Segundo os procuradores do Departamento de Investigação e Acção Penal (DCIAP), para favorecer os interesses do Grupo Espírito Santo, Ricardo Salgado entregou ao antigo ministro mais de cinco milhões de euros. O antigo “dono disto tudo” foi acusado de dois crimes de corrupção ativa e um de branqueamento de capitais e entregou no processo dois relatórios médicos, atestando a sua condição como doente de Alzheimer, manifestando até disponibilidade para ser submetido a uma perícia médico-legal.
“O arguido Ricardo Salgado quis, e conseguiu, que o arguido Manuel Pinho promovesse, publicitasse e beneficiasse indevidamente os interesses, diretos e indiretos do Grupo Espírito Santo, por exemplo, aprovando e influenciando a aprovação de legislação no âmbito do setor do turismo, como foi os caso do PIN” das herdades da Comporta e do Pinheirinho, “revogando uma decisão da Autoridade da Concorrência sobre um dos três maiores clientes do BES, a BRISA”; “satisfazendo em contra-relógio a pretensão” da Águas do Vimeiro, gerida por um irmão de Ricardo Salgado” e apoiando a escolha da Herdade da Comporta para receber a “Ryders Cup”.
Estas são, em síntese, as suspeitas que recaem sobre Manuel Pinho e Ricardo Salgado na acusação do DCIAP. Para os procuradores, as contrapartidas recebidas pelo antigo ministro da Economia, com o conhecimento da mulher, Alexandra Pinho (acusada de um crime de branqueamento de capitais e outro de fraude fiscal), superam os cinco milhões de euros.
E quais foram? A acusação do DCIAP detalha:
- Concessão de crédito pelo BES até 2,6 milhões de euros para aquisição de um prédio, em Lisboa
- Pagamento através de cheques compensação a Alexandra Pinho até 230 mil euros
- 15 mil euros mensais até 2014, recebido na offshore “Tartaruga Foundation”
- Alexandra Pinho como curadora do BESPhoto/BESART com ordenado de 7 mil euros/mês
- 500 mil euros pagos diretamente, a 11 maio 2005
- passagem à reforma aos 55 anos com pensão equivalente a 100% do salário, 62 mil euros. Esta pretensão foi negada negada em 2010 pelo Fundo de Pensões do Banco, tendo sido substituída pelo regresso de Pinho como administrador do BES/África com ordenado equivalente
- Manutenção do acordo compra por 3,4 milhões de euros pelo GES do prédio comprado por Manuel Pinho
A 4 de outubro de 2012, foi aberta a investigação que dura há uma década e que terá, no próximo mês, a primeira acusação contra Ricardo Salgado e Manuel Pinho. Leia aqui a história dos bastidores do processo, recheada de peripécias e guerrilhas entre juízes, advogados e procuradores
O processo EDP, onde se investigaram estes factos é composto por 86 volumes e mais de 400 apensos. A matéria que relaciona Manuel Pinho e outros arguidos com a EDP e com os mecanismos denominados CMEC (Custos de Manutenção de Equilíbrio Contratual) é objeto de outro inquérito, originado por extração de certidão do processo agora acusado, esclarece uma nota do DCIAP, publicada na sua página na Internet, que resume a acusação contra o casal Pinho e Ricardo Salgado
A defesa de Manuel Pinho entregou, esta quarta-feira, um pedido de “habeas corpus” (libertação imediata) no Supremo Tribunal de Justiça, considerando que o prazo para deduzir uma acusação e pedir a renovação da medida de coação tinha caducado a 14 de dezembro. De acordo com o documento a que a Agência Lusa teve acesso, o advogado Ricardo Sá Fernandes defende que o ex-governante foi detido no dia 14 de dezembro de 2021, pelo que a sua privação de liberdade começou logo a contar nesse dia e não apenas no dia seguinte, quando foi proferido o despacho das medidas de coação que estipulou a prisão domiciliária.
“Está, assim, ultrapassado o prazo máximo de duração da medida privativa da liberdade que impende sobre o requerente”, pode ler-se no pedido de “habeas corpus”, que acrescenta: “Não deve suscitar qualquer dúvida que, tendo o requerente sido detido pelas 10h do dia 14 de dezembro de 2021, a sua situação de privação da liberdade não pode durar mais do que um ano sem que seja deduzida uma acusação”.
O despacho de acusação foi, entretanto concluído, e conhecido esta quinta-feira.