Aqui, é indiferente se falamos de Isabel II ou de uma plebéia que também morreu. A intervenção dos técnicos de tanatopraxia, nos corpos de uma e de outra, é exatamente a mesma. Mediante injeções numa artéria (femoral ou carótida, por exemplo) e numa veia, os tanatopractores (designação daqueles profissionais) introduzem no corpo “muitos fluidos – conservantes, desinfetantes e outros produtos”, diz à VISÃO Paulo Carreira, diretor-geral de negócio da Servilusa e presidente da Associação Portuguesa dos Profissionais do Setor Funerário.
No caso da rainha ou da plebéia imaginária, aqueles químicos “retardam a decomposição dos corpos”, devolvem-lhes “a coloração da pele” e “higienizam-nos”, reduzindo a presença e crescimento de microorganismos, como fungos e bactérias, além de “eliminarem manchas provenientes de hematomas e de outras características”, acrescenta Paulo Carreira. O responsável nota, ainda, que no Reino Unido e nos países escandinavos a tanatopraxia “é muitíssimo comum”, uma vez que os seus rituais religiosos e hábitos culturais conduzem a longos velórios, de 15 dias ou mais.
A tanatopraxia até elimina manchas de hematomas, diz Paulo Carreira, presidente da Associação Portuguesa dos Profissionais do Setor Funerário
Deve-se então ao embalming, como os anglo-saxónicos designam a tanatopraxia, a conservação do corpo de Isabel II, que faleceu no palácio de Balmoral, na Escócia, no passado dia 8, e que será sepultada na capela de Windsor esta segunda-feira, 19. “De preferência, a intervenção deve ser feita logo após o óbito, porque o objetivo é retardar a decomposição do corpo antes que ela comece”, diz Paulo Carreira. Que acrescenta ser “normal que a tanatopraxia mantenha o seu efeito prático durante 15 dias”, sem necessidade de colocar o corpo numa câmara frigorífica.
A tanatopraxia está agora também vulgarizada em Portugal, nos pacotes habituais de funerais, apesar de os enterros se fazerem, entre nós, de forma rápida, entre 36 e 48 horas após o óbito. Mas o trabalho dos tanatopractores (credenciados pela Direção-Geral da Saúde para o exercício da profissão) é necessário, defende o presidente da Associação Portuguesa dos Profissionais do Setor Funerário. “Os velórios são feitos em capelas, onde o corpo está exposto, com frequência de caixão aberto, no meio das pessoas, e em que, muitas vezes, há até o ritual de o tocar e beijar”, lembra. Por isso, diz, “faz todo o sentido a higienização do corpo e uma correta tanatopraxia, para a última despedida ser o mais digna possível”.
Graças à tanatopraxia, o corpo de Isabel II será, pois, sepultado em perfeitas condições na capela de Windsor, 11 dias após a sua morte (e junto ao pai, Jorge VI, à mãe, Isabel Bowes-Lyon, à irmã, princesa Margarida, e ao marido, Filipe, duque de Edimburgo). Na certeza, porém, de que, entre a pedra tumular e o túmulo, será colocado um produto selante, para não haver surpresas com maus odores – e até por uma questão de saúde pública. São conhecidas numerosas ocorrências históricas de acidentes infecciosos provocados por restos mortais em decomposição.