O projeto Curious Cures, desenvolvido durante dois anos e levado a cabo pela Biblioteca da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, pretende dar a conhecer mais de 180 manuscritos que contêm as receitas médicas recomendadas por especialistas na época medieval. O objetivo é digitalizar, catalogar e conservar os documentos que “viajaram” diretamente dos séculos da Idade Média.
Caracterizadas como “bizarras”, as mais de 8 mil receitas médicas detalhadas nos manuscritos incluem tratamentos derivados de animais mas também formas de curar ossos partidos ou determinar se um crânio foi fraturado.
As receitas médicas são apresentadas juntamente com uma série de instruções simples, tal como um livro de culinária atual. Nos receituários estão presentes alguns ingredientes comuns com os quais estamos familiarizados, como é o caso das ervas – alecrim, tomilho, hortelã, e das especiarias, como a pimenta e o gengibre, por exemplo.
Contudo, algumas das curas para as doenças medievais são, agora, questionáveis. De acordo com os manuscritos, para quem sofria de doença reumática inflamatória, o tratamento passava por encher um cão com caracóis e sálvia (era aromática) e assar o animal numa fogueira. A gordura processada era usada para fazer a pomada. Um outro exemplo é a cura para as cataratas: uma receita sugeria misturar a vesícula biliar de uma lebre com mel e aplicar a mistura no olho com uma pena.
“Estas receitas recordam a dor e a precariedade da vida medieval: antes dos antibióticos, antes dos antisséticos e antes dos analgésicos como os conhecemos hoje”, explica James Freeman, especialista em manuscritos medievais que lidera o projeto. “Por detrás de cada receita, por muito distante que seja, encontra-se uma história humana: experiências de doença e de dor, mas também o desejo de viver e de ser saudável. Alguns dos mais comoventes são os remédios que falam das esperanças ou desilusões trágicas do povo medieval: uma receita para fazer um homem e uma mulher terem filhos, para saber se uma mulher grávida tem um menino ou uma menina e para uma mulher dar à luz uma criança morta”, acrescenta.
Além das queixas do dia-a-dia, os documentos que agora são recuperados revelam algumas das doenças mais comuns e preocupantes que afligiam a população na altura, como úlceras que com a capacidade de se multiplicarem no organismo ou até mesmo cancro.
O mentor da investigação refere, ainda, que todas as imagens e descrições dos manuscritos serão publicadas na Biblioteca Digital de Cambridge, ficando disponíveis para qualquer pessoa, em qualquer lugar do mundo com acesso à internet. “Cada manuscrito será acompanhado por uma introdução acessível destinada a um público geral. O objetivo é ajudar tanto os investigadores como o público a compreender, estudar e valorizar estes artefactos únicos e insubstituíveis”, conclui.