Fechados numa das salas do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), durante dois dias, três procuradores franceses conseguiram, finalmente, vasculhar o conteúdo de 12 discos externos que estavam na posse do hacker português Rui Pinto, em junho de 2019, aquando da sua detenção na Hungria, mas que as autoridades francesas conseguiram copiar. Sem a chave de encriptação, que dava acesso ao conteúdo dos mesmos, os magistrados insistiram, nos últimos anos, em obter a colaboração do pirata informático português. De acordo com uma fonte judicial, o objetivo do encontro foi claro: desvendar os segredos dos negócios do futebol em França.
Acionando o mecanismo de Decisão Europeia de Investigação (DEI), o Ministério Público francês procurou, logo em 2020, chegar ao pirata informático português, por forma a abrir o conteúdo dos discos. Porém, em Lisboa, a Procuradoria-Geral da República tardou em dar uma resposta, o que, à época, foi entendido como uma retaliação pelo facto de os franceses terem copiado a informação dos discos apreendidos à ordem de um processo em Portugal. Aliás, o pedido de França ficou registado no Ministério Público português com o número 683/20.5TELSB, o que mostra, claramente, que a solicitação chegou no ano 2020.
Relato de Diligência Externa (RDE)
Nos dias 21 de outubro de 2015, os advogados Aníbal Pinto e Pedro Henriques e o dono da Doyen, Nélio Lucas, encontraram-se na área de serviço da A5. O encontro foi acompanhado pelos inspetores Hugo Monteiro e Aida Freitas, que assinaram o relatório de vigilância, mas, em tribunal, Aida Freitas admitiu que não ouviu nada do que foi dito.
“Aníbal Pinto referiu que o negócio seria num valor entre meio milhão e um milhão de euros. O suspeito referiu que o dito referido cliente foi o autor e responsável pela criação do domínio e conteúdos divulgados no site Football Leaks”
“Nélio Lucas e Pedro Henriques, por diversas vezes, afloraram na conversa que estariam a ser vítimas de crime e que a conduta do suposto cliente seria criminosa. Aníbal Pinto referia-se sempre à situação como um ‘negócio’”
“Aníbal Pinto assumiria ainda a contratualização da situação, a emissão de uma nota de honorários como advogado, a emissão de recibo pessoal (mencionando inclusive o IVA e o IRC relativos à situação) e a confidencialidade do serviço prestado”
19 de janeiro de 2021, julgamento
Aida Freitas
“Não ouvi nada do que eles falaram. Assinei o Relato de Diligência Externa, mas não li o que assinei. Tenho de ser muito honesta, muito sincera. Não estava à distância suficiente”
21 de abril de 2022
Hugo Monteiro
“Quando falo em elaborar o RDE é falar do conteúdo. Quem escreve pode ser qualquer um dos elementos [que participam na operação]. O conteúdo foi relatado por mim, mas quem escreveu no computador pode até ser um estagiário”