No fim-de-semana, foram cancelados cerca de uma centena de voos, só no Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa. O caos nos aeroportos parece estar para durar e, em período de férias, é essencial ter em mente os seus direitos.
Na terça-feira, 5, na sequência de “várias dezenas” de reclamações, a DECO instou o Ministério das Infraestruturas e da Habitação e a Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC) a desencadearem “uma intervenção célere e eficaz que acautele os interesses dos passageiros” com voos adiados ou cancelados.
De acordo com a ANAC, as reclamações apresentadas por passageiros aéreos, no primeiro semestre deste ano (6 782), aumentaram 60% comparativamente com o período homólogo (4 207), quando o tráfego aéreo ainda estava bastante limitado pela pandemia.
Esta quarta-feira, 6, serão ouvidos na Assembleia da República o presidente da ANA, José Luís Arnaut, e também o presidente executivo da entidade gestora dos aeroportos, Thierry Ligonnière. Os deputados do PSD convocaram a audição para pedir esclarecimentos acerca dos problemas nos aeroportos de Lisboa e do Porto.
Um dos pretextos para o encontro é classificação do Aeroporto Humberto Delgado no ranking mundial elaborado pela organização de defesa dos direitos dos passageiros AirHelp. O aeroporto da capital surge na última posição, em 132.º lugar, enquanto o Aeroporto Sá Carneiro, no Porto, figura como 8.º pior.
A VISÃO, com o apoio da coordenadora do Departamento Jurídico e Económico da DECO Proteste, Sónia Covita, responde a algumas questões essenciais.
Se o meu voo estiver atrasado tenho direito a indemnização?
Segundo a diretiva europeia que protege os direitos dos passageiros aéreos (EC 261 2004), só há lugar a indemnização caso o atraso seja superior a três horas. Se a viagem for até 1 500 quilómetros de distância, pode receber €250, se esperar mais de três horas ou não chegar a descolar. Além de 1 500 quilómetros, no Espaço Económico Europeu (EEE), e entre 1 501 e 3 500 em viagens fora do EEE, a compensação ascende aos €400. Já nos percursos superiores a 3 500 quilómetros, com partida e chegada fora do EEE, o limite da indemnização é de €300, após três a quatro horas de atraso, e de €600 se demorar mais de quatro horas ou nem sequer a levantar voo. Atenção: O cálculo é feito com base na hora de chegada ao destino e não da partida. E a quantia dependerá sempre da avaliação das circunstâncias.
A companhia aérea não tem nenhuma responsabilidade enquanto espero?
Sim, tem. É responsável por prestar assistência gratuita, que inclui refeições, bebidas, duas comunicações (telefone ou email), alojamento (se o voo alternativo não for no mesmo dia) e transporte entre o local de alojamento e o aeroporto. “É de sublinhar que os meios de subsistência e as comunicações prestados devem ser proporcionais ao período de espera. Nesse sentido, não é aceitável que haja situações em que num atraso de muitas horas a companhia só forneça, por exemplo, uma garrafa de água e um voucher de valor tão reduzido que não permita comprar alimentação condigna num aeroporto”, nota Sónia Covita. É possível reclamar este apoio com um atraso mínimo de duas horas em viagens até 1 500 quilómetros; três horas se a distância for superior a 1 500 quilómetros dentro do EEE ou entre 1 501 e 3 000, envolvendo um aeroporto fora do EEE; quatro horas, se o destino for a mais de 3 500 quilómetros e implicar um aeroporto fora do EEE.
O que muda se o atraso for superior a cinco horas?
Nesse caso, se não quiser seguir viagem, tem direito a ser reembolsado e a ser transportado para o local da partida gratuitamente e na primeira oportunidade. Contudo, se preferir, também pode escolher embarcar noutra data que lhe seja conveniente.
E se o meu voo for cancelado? Quais são os meus direitos?
Se o cancelamento for comunicado aos passageiros pelo menos 14 dias antes da partida, não há lugar a indemnização. Se só souber entre sete a 14 dias antes, e lhe garantirem uma viagem até duas horas antes do voo cancelado, com chegada, no limite, quatro horas depois do inicialmente previsto, também não. Já se for avisado nos sete dias anteriores à viagem, têm de garantir-lhe um voo com partida até uma hora antes do anterior e aterragem até duas horas depois do programado. Se isso não acontecer, a companhia aérea está obrigada a garantir-lhe o reembolso do bilhete no prazo de sete dias ou o regresso ao ponto de partida ou ao destino final, numa data que lhe seja conveniente e em condições semelhantes. Também neste caso tem direito a assistência gratuita por parte da companhia aérea (refeições, bebidas, duas comunicações (telefone ou email), alojamento (se o voo alternativo não for no mesmo dia) e transporte entre o local de alojamento e o aeroporto). Atenção: Se um voo for antecipado em mais de uma hora, também é possível ser considerado “cancelado” e dar lugar a indemnização.
Afinal, quanto dinheiro posso receber se o meu voo for cancelado?
Numa viagem com o máximo de 1 500 quilómetros, a indemnização é de €125 até duas horas de espera e de €250 acima desse período. Se aguardar até três horas por um novo voo de mais de 1 500 quilómetros no EEE ou entre 1 501 e 3500 fora do EEE, a compensação máxima é de €200. Mais de três horas de espera, ou nem sequer embarcar, já poderá valer €400. Os voos superiores a 3 500 quilómetros (fora do EEE) garantem uma compensação de €300 até quatro horas de atraso, acima desse período, ou se o avião nunca aparecer, o valor ascende aos €600.
Disseram que vão deixar-me em terra porque o voo está em overbooking (sobrelotado). O que posso fazer?
Além de ter direito a assistência gratuita por parte da companhia aérea – (refeições, bebidas, duas comunicações (telefone ou email), alojamento (se o voo alternativo não for no mesmo dia) e transporte entre o local de alojamento e o aeroporto) – também pode optar pelo reembolso, com eventual regresso ao ponto de partida e reencaminhamento para o destino final. Por outro lado, é livre de preferir reagendar a viagem para o destino noutra data que lhe seja conveniente.
E o overbooking não dá direito a indemnização?
Sim, dá. Numa viagem inferior a 1 501 quilómetros, recebe entre €125 (até duas horas de atraso) e €250 (além das duas horas). Acima dos 1 500 quilómetros dentro do EEE e entre 1 501 e 3500 noutros voos, se esperar até três horas, a indemnização sobe para os €200. Além das três horas ou se não levantar voo, duplica para os €400. Se for para um destino a mais de 3 500 quilómetros de distância (com partida e chegada fora do ZEE), até quatro horas recebe €300, mas este valor pode atingir os €600 acima das quatro horas de atraso ou em caso de cancelamento.
A companhia diz que não tenho direito a indemnização porque o atraso/cancelamento deveu-se a “circunstâncias extraordinárias”. Afinal, que circunstâncias são essas?
Mau tempo, decisões ligadas à gestão de tráfego aéreo, riscos de segurança ou agitação política são consideradas “circunstâncias extraordinárias” válidas. No entanto, mesmo nestes casos, tem direito a assistência gratuita por parte da companhia aérea (refeições, bebidas, duas comunicações (telefone ou email), alojamento (se o voo alternativo não for no mesmo dia) e transporte entre o local de alojamento e o aeroporto). Além disso, pode solicitar o reembolso ou reagendar o voo para uma data conveniente, sem mais custos associados. “Efetivamente, há situações que as companhias não conseguem controlar, mas há uma parte contratual que deve sempre ser cumprida, refiro-me aos deveres de assistência”, sublinha Sónia Covita.
As greves também são consideradas “circunstâncias extraordinárias”?
Sim, se a greve for do pessoal de segurança do aeroporto, da equipa de assistência às bagagens, dos controladores aéreos ou provocada por instabilidade política. Atenção: Se a greve for do pessoal da companhia aérea, já tem direito às compensações previstas, desde que o seu voo tenha sofrido perturbações. Os problemas técnicos com as aeronaves também não são um motivo atendível para recusar compensações financeiras.
E o coronavírus?
Sim, as perturbações causadas pelo coronavírus também são consideradas “circunstâncias extraordinárias” e não dão lugar a indemnização. Contudo, se o seu voo for cancelado devido à pandemia, tem direito ao reembolso do bilhete ou a reagendar o voo para uma data mais conveniente. No entanto, é da responsabilidade do passageiro garantir que respeita todas as exigências necessárias para viajar relacionadas com a prevenção da covid-19.
Com quem devo reclamar?
O primeiro passo é entrar em contacto com a companhia aérea, mas também com o aeroporto. Caso não tenha resposta no prazo de seis semanas, a contar da receção da reclamação, ou a solução proposta não seja satisfatória, deve reclamar junto do organismo responsável pela proteção dos direitos dos passageiros do país em causa. Em Portugal, é a Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC). Guarde todos os documentos relacionados com o voo (cópia da reserva e da eventual reclamação apresentada à companhia e respetiva resposta), assim como todas as faturas de despesas extra. Fotografe os painéis informativos ou os comunicados da companhia aérea e não assine nada que possa comprometer os seus direitos.