Fraude fiscal qualificada e branqueamento de capitais. É esta a suspeita que recai sobre o empresário Mário Ferreira, dono da TVI, e que levou, esta quarta-feira, o Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), a Polícia Judiciária e a Autoridade Tributária a avançarem para uma operação buscas em algumas das suas empresas ligadas ao negócio náutico. EM causa está um negócio que remonta a 2014: a compra do navio Atlântica aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo (ENVC) por 8,5 milhões e a quase imediata revenda por 17 milhões.
As buscas, segundo do DCIAP; decorreram em Nas buscas no Funchal, Porto e em Malta. Estiveram envolvidos 2 magistrados judiciais, 5 magistrados do Ministério Público, 19 inspetores e peritos forenses da DSIFAE e 12 elementos da Unidade de Ação Fiscal da GNR.
Desde 2014 que o negócio tem suscitado várias dúvidas a Ana Gomes, antiga eurodeputada do PS, que avançou com queixas-crime na Procuradoria-geral da República e, posteriormente, na Procuradoria Europeia, devido à suspeita de má utilização de fundos comunitários.
Avaliado em 29 milhões de euros, numa primeira fase, a venda do navio “Atlântida” foi adjudicada a uma empresa grega, a “Thesarco Shipping”, por 12,8 milhões de euros. Porém, esta sociedade acabaria por desaparecer do concurso, fazendo com que o segundo classificado, a Mystic Cruises de Mário Ferreira, comprasse o navio por 8,5 milhões – a segunda proposta mais alta.
Uns meses depois, já em 2015, Mário Ferreira revendeu o navio a uma empresa sedeada em Malta, a International Trade Winds pelo tais 17 milhões, sendo que existem suspeitas de que esta última sociedade pertence ao próprio Mário Ferreira e, como alegou Ana Gomes num dos processos que lhe foi movido pelo empresário, “está indiciado” que foi utilizado um esquema de “venda a próprio” através de uma companhia de Malta, com a consequente fuga aos impostos.
Paralelamente a estas suspeitas, o Ministério Público chegou também a abrir um inquérito por suspeitas de gestão danosa contra antigos administradores dos ENVC, mas arquivou-o em 2017. Segundo um procurador do DCIAP, em vez de getsão danosa, houve, isso sim, falta de preparaçºao dos gestores que pouco ou nada percebiam de gestão naval, avançando com um negócio que acabaria por provocar um prejuízo relevante ao Estado, já que tinham sido investidos 70 milhões de euros na construção do navio.
“Os membros do Conselho de Administração, quer da Empordef [empresa pública que tutelava os Estaleiros Navais de Viana do Castelo] quer dos ENVC, por regra eram indigitados pela tutela, sendo que as nomeações não eram suportadas exclusivamente em critérios empresariais, obedecendo, também, a critérios de natureza política”, referiu o despacho de arquivamento do processo, concluindo: “Assim se compreende que, no período em que foram celebrados e executados os contratos em causa nestes autos, nenhum dos presidentes do Conselho de Administração ou restantes membros tivesse formação em Engenharia Naval”.
Esta semana, Mário Ferreira esteve envolvido noutra polémica: um financiamento de 40 milhões de euros por parte do Banco Português do Fomento (BPF) ao abrigo do Programa de Recapitalização Estratégica. Em declarações à agência Lusa, a deputada bloquista Mariana Mortágua indicou que o partido irá entregar na Assembleia da República um requerimento para uma audição à presidente do BPF, Ana Freitas, justificando que “deve haver um enorme escrutínio sobre estes fundos”.
“É preciso garantir que as empresas que recebem estes fundos são empresas exemplares do ponto de vista da sua relação fiscal. Não podemos permitir ter empresas que recorrem permanentemente a expedientes como empresas em Malta, por exemplo, para fazer os seus negócios, sendo depois beneficiadas com financiamentos públicos, sejam eles de que forma forem”, defendeu.
Para a deputada bloquista, é “preciso questionar em que tipo de projetos é que estamos a investir o dinheiro do Plano de Recuperação”, isto é, “se estamos a investir em projetos industriais, que aumentem a autonomia do país, que diversifiquem a capacidade industrial do país ou, se pelo contrário, estamos a investir em empresários”, que, diz, “insistem nestes projetos megalómanos de turismo e de imobiliário, que o país já viu no passado e que já deram muito errado”.