As oito horas de sono seguidas durante a noite podem parecer o ideal e o “natural”, mas o conceito é relativamente recente. Segundo o historiador A. Roger Ekirch, professor do departamento de História da Universidade Virginia Tech, os humanos costumavam dormir em períodos separados do dia na Europa e na América pré-industriais – um primeiro e um segundo sono seriam o normal, com uma pausa de algumas horas pelo meio para comer, falar, rezar, fazer sexo ou tomar medicamentos, uma prática que ficou conhecida como o “sono bifásico”. “Um padrão de sono desconhecido ao mundo moderno”, explica o historiador, cujas investigações remontam aos tempos da Grécia antiga, o que lhe permitiu encontrar mais de duas mil referências a esta forma de dormir, numa dúzia de línguas diferentes.
Para este especialista, a mudança para as oito horas de sono seguidas surgiu com a eletricidade e como consequência da Revolução Industrial, com o pensamento capitalista de que o sono era uma perda de tempo e que o aproveitamento no trabalho era o que realmente importava.
O trabalho de Ekirch e de outros historiadores e antropólogos está a ajudar cientistas especializados no sono a entenderem melhor o que é uma noite bem dormida e a enfrentarem alguns dos problemas daí derivados. “Um grande número de pessoas que hoje sofrem de insónias no meio da noite, o principal distúrbio do sono nos Estados Unidos — e ouso dizer na maioria dos países industrializados —, em vez de experimentarem uma qualquer desordem, estão, de facto, a experimentar um remanescente muito poderoso ou eco deste padrão anterior de sono”, acredita Ekirch.
Nas suas investigações, Ekirch encontrou várias referências a um “primeiro” e “segundo” sono. Já no século XVI, um manual de um médico francês aconselhava os casais a procriarem depois do primeiro sono, e não ao final do dia, por ser mais “prazeroso”. No início do século XIX, no entanto, o primeiro sono e o período intermediário de vigília começaram-se a expandir em detrimento do segundo sono, descobriu Ekirch. No final do século, o segundo sono era pouco mais do que virar-se na cama para mais 10 minutos de sesta.
Mas foi a Revolução Industrial que determinou uma transição total do sono, como explica Bem Reiss, professor na Universidade Emory em Atlanta, pelas “mudanças na organização económica, numa altura em que se tornou mais eficiente rotinar o trabalho e ter um grande número de pessoas a trabalhar nas fábricas ao mesmo tempo e a fazer o máximo de trabalho da maneira mais concentrada possível”. O nosso horário de sono moldou-se às exigências do mercado e ficou mais apertado, conclui o professor.
Russell Foster, diretor do Instituto de Neurociências de Oxford, explica, por sua vez, que dormir em fases diferentes do dia não era visto como problemático no passado, mas as expectativas atuais sobre o que é uma noite bem dormida (as oito horas) nem sempre ajudam quem tem historiais de insónias, por exemplo. “O sono de cada humano é muito variável. Não é tudo igual para todos. Não se deve preocupar com o tipo de sono que tem”, diz Foster.