Fixemos esta medida: até uma criança atingir 1,35 metro de altura é obrigatório sentá-la na cadeirinha do carro ou no banco elevatório, sistemas de retenção para crianças que podem salvar vidas em caso de acidente rodoviário. Não basta ter 12 anos para permitir aos filhos, sobrinhos ou outras crianças transportadas que passem a sentar-se no banco da frente do automóvel ou a abdicar da cadeirinha – é a altura de 1,35 metro que determina a mudança. Mas, isso nem sempre está a acontecer.
Em outubro passado, uma equipa de técnicos da Associação Para a Promoção da Segurança Infantil (APSI) passou quatro horas em ambiente de auto-estrada, nas portagens Alverca, Pinhal Novo e Grijó, para realizar o Estudo de Observação de Transporte de Crianças em Veículos Ligeiros. A observação faz-se na portagem, uma vez que assim a associação não precisa de ajuda das autoridades para mandar parar o carro. Não há intervenção ou diálogo com o condutor, apenas observação. E, neste caso, foram observadas 711 crianças, menos do que em 2018 (781), valor que já tinha diminuído face a 2016 (1 886) – em causa poderá estar o simples facto de os carros passarem mais na portagem eletrónica do que na manual. Os técnicos registaram se as crianças tinham até três anos ou mais, se iam sentadas à frente ou atrás, se usavam cadeirinha ou não, se esta estava bem instalada ou se iam ao colo de um adulto.
Este estudo de observação serviu para tirar uma conclusão que espantou a APSI: até aos 12 anos, cerca de 16% do total das crianças observadas viajava sem qualquer proteção (iam ao colo ou à solta), sendo que, no grupo das crianças mais novas (até aos 3 anos) essa percentagem é mais baixa (11,8%). Dos 84% das crianças a usar sistema de retenção, 31% apresentavam erros de utilização. “Houve uma diminuição da utilização da cadeirinha para números de há mais de uma década, o que contraria a evolução que vinha a ser verificada nos últimos estudos realizados”, explica Helena Sacadura Botte, secretária-geral da associação sem fins lucrativos e de utilidade pública.
Entre os erros básicos detetados nas crianças até aos três anos salientam-se alguns: quando o arnês (cinto interno da cadeirinha) não está apertado, está aberto, quando está descaído sobre o braço ou quando está muito largo, com folga exagerada; quando o cinto fica por baixo dos braços, deixando a criança presa apenas pela cintura; quando crianças grandes usam cadeira pequena ou crianças muito pequenas, que ainda deviam ir no ovo, vão numa cadeira grande.
Já nos meninos e meninas mais velhos (3-12 anos) o erro poderá ser o uso do banco elevatório demasiado cedo e o cinto fica a incomodar no pescoço e põe-no por baixo do braço. Este é um erro que pode levar à morte por hemorragia interna do fígado ou do baço (órgãos muito irrigados de sangue), porque o cinco está pensado para partir ossos, protegendo assim os órgãos vitais. “Existe uma maior preocupação dos pais para com as crianças mais novas, até aos três anos”, nota Helena Sacadura Botte.
Quem transporta crianças pequenas deve saber que até aos 3 a 4 anos, estas devem ser sentadas com as costas voltadas para a frente. Isto porque, ao contrário dos adultos, em que o peso da cabeça representa 6% do peso total do corpo, nos mais pequenos essa proporção aumenta e muito, para 25% em bebés até um ano de idade. Além de um quarto do peso do bebé estar na cabeça, o seu pescoço ainda não está totalmente formado e é cartilaginoso, por isso, se a cabeça fizer um estiramento do pescoço pode levar a uma rutura da medula espinal. Viajando de costas, as costas da cadeira vão dar um apoio uniforme à cabeça, pescoço e coluna vertebral. “Os choques frontais são os mais violentos e ir virado para trás evita a morte de nove em dez crianças”, chama a atenção a técnica em segurança infantil.
Mas, colocar a cadeirinha da criança no lugar do passageiro da frente implica obrigatoriamente desligar o “airbag” do carro. Se se mantiver acionado pode causar um acidente muito grave – a abertura desta bolsa de ar de segurança equivale a uma explosão muito forte e ao embater nas costas da cadeira pode provocar fraturas cranianas e eventual perda de massa encefálica e consequente morte ou lesões permanentes.
Helena Sacadura Botte acredita que os dois anos de pandemia, em que houve menos educação para a saúde, seja dos cursos pró-parto e o ensino para a parentalidade, poderão estar na causa para estas famílias que não sabem como usar corretamente a cadeirinha.
Apesar de, em 2021, as crianças terem tido menor circulação, a APSI registou sete mortes de passageiros crianças e mais de 80 que ficaram feridas – um número contabilizado apenas através da recolha na comunicação social, pois só no segundo semestre de 2022 será divulgado o novo relatório da segurança infantil em Portugal.