As sete pessoas detidas na passada sexta-feira, 14, no Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, por apresentarem comprovativos falsos de testes negativos para a Covid-19, são um bom exemplo do boom de oferta e de procura destes comprovativos, um requisito nacional, europeu e mundial para a livre circulação de pessoas, pelo menos, nas viagens de avião. As três mulheres e os quatro homens, todos cidadãos brasileiros entre os 26 e os 36 anos, seguiriam viagem dentro do espaço europeu, para a Áustria, caso não tivessem sido apanhados. Alegadamente, seis são clientes, ou seja compraram os comprovativos, enquanto um integra parte do esquema de falsificação de testes falsos e ficou com termo de identidade e residência. “A falsificação de resultados dos testes põe em causa a confiança nos mesmos, gera insegurança nos operadores e no cidadão comum, inviabiliza a adoção das medidas adequadas à contenção da propagação e, suscitando a dúvida sobre a autenticidade dos comprovativos”, lê-se no comunicado da Polícia Judiciária.
“Fazemos testes Covid negativos para pessoas que queiram viajar para o estrangeiro ou para arranjar trabalho. Tudo é feito em 24 horas, sem grandes problemas” ou “Compre dois testes negativos e obtenha o terceiro gratuitamente!” – são alguns dos anúncios publicados em fóruns de hacking na dark web. Expressões como “doença do corona” ou “epidemia da Covid” também devem ser um alerta de que o documento não é verdadeiro.

Já no ano passado, a Check Point Software Technologies, empresa israelita fornecedora de serviços e equipamentos de cibersegurança, através do seu departamento que faz investigação de ataques de cibersegurança, fazia notar o crescimento destes ataques. E o que, em outubro passado, estaria mais ou menos adormecido, volta a surgir em força e também em português.
Com o aumento de casos devido à variante Ómicron são vários os grupos que tentam aproveitar-se da situação. “Há um aumento significativo na oferta, há mais grupos no Telegram, por exemplo, a oferecer estes serviços. Em outubro eram cerca de 450 mil subscritores a nível mundial, agora acreditamos que serão muitos mais”, explica Bruno Duarte, técnico especialista sénior da Check Point.
Em março de 2021, os anúncios ultrapassavam os 1 200 (o triplo desde janeiro de 2021), com promoção de ofertas especiais “compre 3, pague 2” ou versões DIY (faça você mesmo) de certificados, gerados em 30 minutos por apenas 25 dólares (22 euros).

Em Portugal, no Telegram, serviço de mensagens instantâneas a funcionar na cloud, foi detetado um grupo com quase 800 subscritores e continua a ser em dólares que as contas ao pagamento em criptomoeda são feitas. Os testes PCR ou antigénio contrafeitos vendidos entre 75 e 100 dólares (65 a 88 euros) passaram a custar 200 a 600 dólares (175 a 526 euros), o que representa um crescimento de até 600 por cento.
“Pagar em criptomoeda é a forma mais segura de os atacantes não serem rastreados. Já o maior perigo para quem faz este tipo de aquisição, além de estar a cometer uma ilegalidade, é expor os seus dados pessoais a desconhecidos e, no futuro, ver sequestradas as suas credenciais ao homebanking”, exemplifica Bruno Duarte.
“Estão uma vez mais a operar com confiança, como podemos ver pelo aumento dramático dos preços na dark web. Os governos tem de se reunir rapidamente para combater o mais recente crescimento do mercado negro, caso não o façam, o risco do número de documentos falsificados aumentar nas próximas semanas e meses é muito alto”, salienta Liad Mizrachi, especialista em segurança da Check Point.

No grupo português com o nome “certificado de vacina covid-19 portugal”, o anunciante promove um documento “100% autêntico”. E, em inglês escreve: “Encomende hoje mesmo o seu certificado de vacina e mantenha-se longe da vacina tóxica”. Uma mensagem em tom negacionista, que poderá ser um sinal de onde as autoridades do cibercrime devem procurar estes grupos. E, a mensagem continua: “Os nossos certificados são 100% autênticos e podem ser usados no trabalho, escola, locais públicos ou em viagens. Todos vêm com um número de lote, o tipo e a data da vacina e uma cópia em PDF do certificado para download com um QR Code que pode ser digitalizado em qualquer lugar”.
E, porque o vírus não escolhe as pessoas que vai infetar, quem se recusa a fazer o teste ou a tomar a vacina contra a Covid-19 vai continuar a fomentar estas práticas ilícitas.