Excluindo o desafio surgido na internet de comer cápsulas de detergente, em 2018, poucas “modas” foram consideradas tão perigosas como a mais recente: comer carne crua apodrecida, desafio que já tem dado que falar nas redes sociais e tem sido altamente desaconselhado pelos especialistas.
“High meat” é a perigosa tendência que surgiu na internet e consiste em deixar carne crua fora do frigorífico ou congelador, durante muito tempo, permitindo que ela chegue a um estado de decomposição avançado, para depois ser consumida. O nome deve-se à alegada sensação de euforia que as pessoas experienciam depois de o fazerem. Os utilizadores do Twitter não tardaram a reagir a esta nova moda, desde as pessoas que partilham a sua experiência, até às que a repulsam veementemente.
“Um amigo convenceu-me a comer carne crua apodrecida ontem e realmente senti-me ótimo. Muito interessante visto que todas as pessoas pensam que é uma loucura”, lê-se, numa publicação. Questionado se a experiência não o deixou doente, o utilizador respondeu: “Não de todo”, mostrando a imagem da carne em questão, com um mês de decomposição.
Várias foram, também, as pessoas que mostraram o seu choque com o estado da carne e com a ideia de a comer. “Perdi muito tempo a ver pessoas que deixam carne de fora e a comem crua e honestamente as imagens deixam-me constantemente quase a vomitar. Pode ser porque a fotografia da comida é difícil de ver, mas…Não estou convertido ao movimento do “high meat”, lê-se, noutra publicação. “Imaginem o cheiro… estou em agonia agora”, acrescentou outro utilizador.
Houve, no entanto, quem conseguisse brincar com a situação. “Pessoas que comem “hight meat” a verem episódios antigos dos Pesadelos na Cozinha onde o Gordon Ramsey vê comida podre nos frigoríficos: Delicioso. Finalmente boa comida”, publicou, de forma irónica, um utilizador.
Também no Youtube têm surgido vários vídeos desta nova moda “high meat”, com milhares de visualizações, como é o caso do vídeo de Kasumi Kriss. Em entrevista ao Vice, a youtuber explicou qual a sensação de experimentar esta carne, sendo que das três vezes que comeu, sentiu-se eufórica duas delas. “A primeira vez senti-me alterada em segundos. Também experienciei pequenas mudanças percetuais: as cores, a música e os sons pareciam de alguma forma mais ricos. A segunda vez, depois da primeira dentada, senti-me mais jovial”, contou.
Naras Lapsys, médico nutricionista, dietista e especialista em saúde gastro-intestinal, em entrevista ao Vice, explicou de onde poderia vir esta sensação de euforia descrita pelas pessoas, sugerindo que pode ter a ver com uma série de bactérias presentes na carne crua. “Se deixarmos [a carne] de fora durante dias ou até meses ou anos, quem sabe que tipos [de bactérias] se vão desenvolver, e algumas dessas bactérias podem ter propriedades químicas que poderão deixar as pessoas alteradas, a alucinar, ou a sentir euforia”, disse.
O médico disse ainda que este consumo pode provocar sérios problemas de saúde, que vão desde intoxicações alimentares até problemas mais graves. “[Deixar a carne apodrecer] é um processo completamente descontrolado, não se sabe que bactérias podem desenvolver-se”, esclarece. E acrescenta: “Existem muitos tipos de bactérias- Salmonella, Shigella, Escherichia coli– que podem surgir. Se estamos a comer comida podre, a questão é: será que o nosso ácido do estômago é capaz de fazer um trabalho bom o suficiente para impedir [as bactérias] de nos intoxicar? E a resposta é não”, afirma.
Lapsys referiu também que os casos mais sérios de intoxicações alimentares podem envolver diarreia, desidratação, ou mesmo provocar danos no intestino.
A Salmonella é, segundo a ASAE, uma das principais bactérias que provoca infeções transmitidas pelo consumo de alimentos, que pode causar problemas tão graves como a febre tifóide, por exemplo. Também a Escherichia coli pode levar a graves intoxicações alimentares. Já a Shigella pode dar origem a disenteria, um tipo de gastroenterite que provoca diarreia com sangue.