Transformações ambientais globais e extinções em massa, tempestades elétricas e radiação cósmica. Segundo um novo estudo australiano, houve um ponto de viragem dramático no percurso da Terra há 42 mil anos e a culpa é de uma inversão temporária dos pólos magnéticos.
Os investigadores, da Universidade de Nova Gales do Sul e do South Australian Museum, chamam a este período “O Evento Adams”, para abreviar o mais completo “Evento Geomagmético Transitório Adams”, um tributo ao autor de ficção científica Douglas Adams, que escreveu a série The Hitchhiker’s Guide to the Galaxy, na qual apresentava a ideia de que o número 42 era a resposta para tudo, incluindo a vida e o universo.
“Pela primeira vez, conseguimos datar com precisão o timing e os impactos ambientais da última troca dos pólos magéticos”, congratula-se Chris Turney, da Universidade e co-autor do estudo agora publicado na Science.
O pólo norte magnético – para onde aponta o ponteiro da bússola – não tem uma localização fixa, graças aos movimentos dinâmicos no centro da Terra, mas ronda, normalmente, o Pólo Norte. Por vezes, por razões que a Ciência ainda não conseguiu esclarecer inteiramente, os movimentos dos pólos magnéticos podem ser mais drásticos. Há 41 ou 42 mil anos, os pólos magnéticos norte e sul trocaram de lugar, no que ficou conhecido como o “evento Laschamp”. Passariam 800 anos até voltarem aos seus lugares habituais.
Até agora, a investigação científica focou-se nas alterações da inversão dos pólos, que levou a um enfraquecimento do campo magnético da Terra para cerca de 28% da sua força de então. O que esta equipa australiana agora descobriu foi que o “pior” foi mesmo durante a “viagem”. “O campo magnético da Terra caiu para apenas 0,6% da sua força durante o Evento Adams”, ou seja, “basicamente ficámos sem campo magnético – o nosso escudo contra a radiação cósmica desapareceu”. Sem esse escudo, a radiação provocou um processo de ionização que “fritou” a camada de ozono, desencadeando uma onda de alterações climáticas em todo o globo.
“Deve ter parecido o fim do mundo”, acredita Alan Cooper, investigador do South Australian Museum e co-autor do estudo, referindo-se às constantes auroras boreais e tempestades elétricas. E terá isso também a fazer com os humanos procurassem mais abrigo em grutas.
Uma das primeiras pistas seguidas pelos investigadores foi a extinção simultânea da megafauna (o conjunto de animais de grandes proporções que conviveram com a espécie humana e desapareceram) na Austrália e na Tasmânia, há precisamente 42 mil anos.
Para esta descoberta, as gigantes árvores kauri da Nova Zelândia desempenharam um papel fundamental – ao analisar os anéis destas árvores, os cientistas conseguiram criar uma cronologia detalhada das alterações atmosféricas da Terra ao longo do tempo. “Usando estas árvores antigas pudemos medir, e datar, o pico nos níveis de radiocarbono na atmosfera causado pelo colapso do campo magnético da Terra”, lê-se.
A protagonista foi uma árvore massiva, com um tronco de de 2,5 metros de diâmetro, que já existia durante o Evento de Laschamp.
A comparação entre a cronologia recém-criada e os registos disponíveis no Pacífico permitiu aos investigadores criar um modelo climático global, descobrindo, assim, que o crescimento das plataformas de gelo e dos glaciares sobre a América do Norte e as grandes mudanças nas principais correntes de vento e sistemas de tempestades tropicais tiveram, na sua origem, o Evento Adams.
O mesmo evento, propõem os cientistas, poderá explicar outros grandes mistérios da evolução. “É a mais surpreendente e importante descoberta em que já participei”, afirma Alan Cooper.