Vários foram os meios de comunicação que noticiaram que um grupo de investigadores tinha encontrado microplásticos em órgãos humanos. No entanto, não foi isso que aconteceu.
Filipa Bessa, investigadora da área dos microplásticos no Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE) da Universidade de Coimbra, esclarece que ainda não foram descobertos microplásticos em órgãos humanos, mas sim um método que os permite detetar em laboratório.
A explicação da especialista surge após vários meios de comunicação, tanto a nível nacional como a nível internacional, terem noticiado que, pela primeira vez, um grupo de cientistas americanos tinha encontrado microplásticos em órgãos humanos. Os resultados do estudo vieram a público através de um comunicado de imprensa publicado pela American Chemical Society, e não através de uma publicação científica, que passa sempre por uma revisão. Acontece que a American Chemical Society interpretou mal os resultados da análise, porque o grupo de especialistas não detetou a presença de plástico no corpo humano: eles apenas relataram a descoberta de uma técnica que permite identificar, extrair e quantificar vestígios de plástico em tecidos humanos.
A metodologia do estudo consistiu em adicionar microplásticos a órgãos humanos (pulmões, fígados, rins, entre outros) que tinham sido doados para finalidades científicas. Posteriormente, foi utilizado um método de citometria para os detetar. Os resultados da análise demonstram que, de facto, foram encontrados microplásticos, mas que os próprios peritos colocaram nos tecidos, com o objetivo de quantificar e identificar os mesmos.
Além disso, os especialistas identificaram a presença de Bisfenol A, que é “um composto químico presente em vários materiais de plástico, apesar de ser já proibido em muitos países”, explica Filipa Bessa à VISÃO. Mas este componente pode conduzir a alguns problemas. “É indicado como um disruptor endocrino, e existem estudos que associam a presença de vestígios deste composto no Homem com repercussões na fertilidade, associação a problemas hormonais, entre outros”, remata.
O método em questão ainda não foi divulgado pelos autores do estudo. Filipa Bessa diz que “pode ser impreciso falar dessa técnica [de citometria] em particular”, uma vez que não se sabe se ela foi, efetivamente, utilizada.
A investigadora afirma ainda que “o método é relevante e parece ser promissor para a deteção de microplásticos em órgãos humanos, mas terá de ser validado e carece de revisão por parte dos pares para que possa ser publicado cientificamente”. Apesar disso, relembra que a existência de microplásticos na alimentação humana é inegável. “É muito relevante saber se também os ingerimos e quais os seus efeitos para a saúde humana. No entanto defendo o princípio da precaução e devemos já agir contra todas as possibilidades de ingestão destas partículas”. Para tal, é necessário “tentar reduzir o uso de plásticos e, quando tivermos de o usar, garantir que não há perdas para o ambiente”.