No próximo sábado, 27 de junho, Tânia Ascensão e Mário Alves não vão casar numa igreja em Coimbra, nem fazer a festa numa quinta na região com 200 convidados, nem partir em lua-de-mel numa viagem ao Japão, Bali e a Singapura. Não: terão uma celebração bem mais comedida. A ginecologista, de 31 anos, e o engenheiro civil, 33, namorados há três anos e já a partilharem casa, vão até à conservatória do registo civil, terão apenas 14 convidados (menos do que os 20 permitidos), entre pais, irmãos, avós e padrinhos. Terminada a cerimónia, na qual todos são obrigados a usar máscara, nubentes incluídos, vão até ao jardim da Quinta das Lágrimas, onde fica a Fonte dos Amores de Pedro e Inês, para o fotógrafo fazer o registo do dia, e seguem para o almoço num restaurante em Coimbra, numa sala exclusiva só para o grupo. Encetado o bolo de casamento, feito pela irmã da noiva, o casal irá descansar, pois no dia seguinte parte para três dias de descanso numa casa de turismo rural na zona do Fundão.
Segundo dados recentes do Instituto dos Registos e Notariado, em abril só se celebraram 102 casamentos, contra os 1 423 de abril do ano passado
Esta festa mais pequena e discreta não anula o casamento religioso que Tânia e Mário tiveram de adiar para 11 de junho de 2021. Já avisaram os convidados que a data é numa sexta-feira, a seguir ao feriado do 10 de junho. “Foi muito difícil arranjar uma data para o próximo ano, porque os fins de semana estão todos ocupados com os casamentos de 2021, mais os adiados deste ano”, explica Tânia. Felizmente quase não tiveram prejuízos com o adiamento do casamento religioso, à exceção da quinta que só garantia o mesmo valor por pessoa remarcando até maio de 2021; e na lua-de-mel, nas viagens aos três países, só na de Singapura perderam cerca de 400 euros.
O mesmo não podem dizer Filipa Silva e Manuel Magina, 32 e 33 anos, do Porto, que já gastaram cerca de €10 mil, entre reservas e sinais à igreja, quinta, fotógrafo, convites, roupa (vestido, fato e sapatos), DJ, flores e lua-de-mel. Já pediram a devolução do dinheiro da viagem de três dias a Istambul, na Turquia, mais 15 no Japão (Osaka, Quioto e Tóquio), mas ainda não receberam resposta da companhia aérea.

Amigos de infância, namoraram quando tinham 19 anos, depois estiveram uma década afastados e reataram o namoro há quatro anos. Sete meses depois foram morar juntos e, em novembro de 2018, durante as férias passadas na Tailândia Manuel pediu Filipa em casamento. Como no ano passado já tinham muitos casamentos entre os seus núcleos de amigos, decidiram marcar para abril de 2020. Mas a pandemia trocou-lhes as voltas à festa que haveriam de ter feito na Quinta de Prata, em Pedrouços, na Maia, muito perto de casa. Já com o estado de emergência decretado mantinham a expectativa de realizar a cerimónia sem vínculo religioso perante 120 convidados, entre poucos familiares e muitos amigos. A breve trecho, tiveram de escolher o 14 de agosto, uma sexta-feira, para casar, e continuam a aguardar a confirmação por parte da quinta de que têm autorização para realizar a festa.

Entretanto, como a ida à conservatória já estava marcada, a 17 de abril, pelas 11 da manhã, lá foram. Ele de fato, ela de vestido azul escuro com estrelinhas e em direto no Zoom para cerca de 30 pessoas. Sem máscaras, numa sala grande e com o devido distanciamento físico trocaram as alianças que já tinham comprado perante uma conservadora descontraída. A seguir, foram buscar sushi e almoçaram em casa.
Filipa Silva e Manuel Magina fazem parte dos casais que disseram “sim” durante os meses de confinamento. Segundo dados recentes do Instituto dos Registos e Notariado (IRN), entre março (965), abril (102) e maio (708) deste ano realizaram-se 1 775, menos 2 993 do que nos mesmos meses de 2019, num total de 4 768 (março 1 256, abril 1 423 e maio 2 089). Ou seja, uma queda de 64%.
Há dois anos, os portugueses já haviam dado sinais de acreditar novamente no casamento. Em 2018, houve um novo aumento no número total de casamentos, registando-se 34 637 a nível nacional, número aproximado só ao de 2012. A pandemia voltou a mudar a tendência.

Num setor que contribui com 0,5% do PIB nacional, e tem um volume de negócios superior a 900 milhões de euros, os profissionais estão a gerir da melhor forma os adiamentos para novas datas ainda este ano, no outono e no inverno, ou para 2021, de modo a que esta indústria não seja tão penalizada. Atualmente, 32,1% dos casamentos foram adiados para o segundo semestre de 2020, 22,5% para 2021 e 6,4% foram mesmo cancelados, segundo dados Belief Wedding Creators, comunidade internacional de organizadores de casamentos. Em Portugal, um estudo feito pela Exponoivos, feira especializada que se realiza há 27 anos, para avaliar o impacto da Covid-19 na indústria dos casamentos concluiu que 86% das empresas reduziram a faturação, 65% entraram em layoff e 35% procederam a redução salarial. Das empresas inquiridas 94% tiveram cancelamentos ou adiamentos e, desses, 65% já tiveram necessidade de adiar mais de uma dezena casamentos. Entre março e junho deste ano já foram cancelados quase nove mil casamentos, o que representa quase 30% do volume de faturação do setor.
Entretanto, foi criado o movimento #juntospelocasamento, do qual fazem parte António Manuel Brito, (CEO da Exponoivos), Carla Salsinha (empresária na AGA – CRI Couture) e Mário Pinheiro (CEO do portal Espaços para Eventos) que já reuniram com o secretário de Estado do Comércio e Serviços, João Torres, de forma a sensibilizar o Governo para a importância da indústria dos eventos sociais no País e para apresentar o Manual de Boas Práticas, conseguindo a autorização para a celebração do casamento em Portugal, conforme orientações da Direção-Geral da Saúde.