Marine Antunes, 29 anos, está em remissão. Foi dada como curada e apresenta-se sempre como “sobrevivente” e nunca como doente oncológica. “Não tive alta hospitalar. Continuo a ser seguida exatamente da mesma forma, com uma consulta anual em Coimbra.”
Há mais de uma década que faz uma vida normal, depois de aos 13 anos lhe ter sido diagnosticado um linfoma não Hodgkin, localizado no mediastino, “a um milímetro do coração”.
Na pequena aldeia de Matas, concelho de Ourém, sentiu-se um extraterrestre, pois até 2003 ninguém tinha visto uma adolescente com cancro. “Foi muito mais difícil lidar com as pessoas do que ter cancro. Além dos olhares e comentários, era muito desconcertante entrar num sítio e as pessoas começarem a cochichar.” Marine não se esquece do episódio em que, numa ida à missa com a família, entrou atrasada na igreja, com o gorro para tapar a careca, e chamou a atenção dos fiéis que se viraram de imediato para ela, a segredar. Nunca levantou o olhar do chão e no fim saiu, discretamente, mas uma senhora agarrou-a pelo braço e perguntou-lhe: “Vais morrer de cancro?”
O certo é que a juventude de Marine foi normal, como a dos colegas de escola: “Eu brinquei, namorei, apaixonei-me, desapaixonei–me… Tudo com cancro. A vida continua.” Para a autora do livro Cancro com Humor, com dois volumes publicados (2013 e 2017) e uma agenda cheia de palestras para desmistificar as questões à volta do cancro, “o pós-cancro é mais difícil, porque antes estamos em piloto automático, o que interessa é tratar”.
Cada pessoa escolhe como encarar a doença e, para Marine Antunes, só há dois caminhos: o fácil e o difícil. Por isso, nas dedicatórias que faz nos seus livros, costuma escrever aos leitores e doentes: “Aproveita esta fase da melhor maneira.”
MÁ IDEIA
> Evitar o doente
> Substituir a palavra cancro por “problema” ou “situação”
> Usar o substantivo cancro para adjetivar uma situação má, como o excesso de trânsito numa rotunda, por exemplo
> Queixarmo-nos do dia a dia a quem está doente
> Falar de novos casos de cancro e de outras doenças
> Aconselhar sobre o que pensar, sentir ou fazer
> Perguntar detalhes do tratamento ou se tem cura
> Usar expressões como “lutar contra”, “travar uma batalha” ou “vencer o cancro”. As metáforas de guerra podem prejudicar as intenções de o doente adotar comportamentos saudáveis
PROIBIDO DIZER
> “Não sei como consegues aguentar”
> “Vai ficar tudo bem”
> “Liga se precisares de alguma coisa”
> “Vê o lado positivo” ou “A melhor coisa é manter-se positivo”
>“No futuro, tudo será melhor”
BOA IDEIA
> Quando não se tem respostas, o melhor é fazer perguntas para perceber o que o doente realmente sente
> Falar de outros assuntos, como o trabalho ou os filhos, para que a doença não monopolize as conversas
> Saber elogiar a aparência, sem falsidades
> Estar em silêncio e ouvir sem interromper, sem corrigir ou julgar
> Dar um simples beijo ou um abraço
> Ser prestável: oferecer ajuda para arrumar a casa; tomar conta dos filhos; organizar um rol de pessoas disponíveis para prepararem refeições familiares e marmitas para a escola, na fase de tratamentos; acompanhar às consultas (e tomar notas), testes e tratamentos
> Planear um almoço fora de casa ou uma saída animada
PARA REPETIR
> “Como te sentes hoje?”
> “Como vão as coisas?”
> “Custa-me ver-te passar por tudo isto. Queres falar sobre o assunto?”