Imagine uma ilhota desabitada, em frente a uma baía, na Cornualha, condado conhecido por ser o cenário de uma das mais belas lendas inglesas, a do Rei Artur e os Cavaleiros da Távola Redonda. A 800 metros da costa, é um afloramento irregular de rocha vulcânica, que se apresenta à superfície de um mar cristalino, e tem pouco mais de quilómetro e meio de uma ponta à outra. Desabitada, obriga a pedir uma autorização para a visitar. Mas, como mantém o seu estado natural, tornou-se um paraíso para as aves.
Só que, na mais recente visita dos conservacionistas para prosseguirem as usas pesquisas sobre as aves marinhas que por ali nidificam, apareceu uma série de elásticos coloridos – milhares deles – o que os deixou perplexos, muito perplexos. Emaranhados no que seriam os restos de uma rede de pesca, levaram-nos a ponderar várias hipóteses: seria aquilo resultado de um naufrágio ou será que alguém lhes estava a pregar uma partida? Será que aquele cenário estava de alguma forma relacionado com a equipa de filmagem que em tempos lá tinha gravado uma adaptação de um romance de Agatha Christie?
A solução do mistério é muito menos romântica do que qualquer das hipóteses aventadas. Segundo os ornitologistas do West Cornwall Ringing Group e do National Trust, parece que os elásticos foram levados para a ilha pelas aves marinhas, porque os confundiram com vermes enquanto procuravam comida na zona continental. Ou seja, as gaivotas de asa escura comuns por ali cruzaram os campos de flores junto à costa devoraram-nas e voltaram para a ilha. Ali, os elásticos apareceram depois de regurgitados pelas aves.
“É muito deprimente, mas um sinal dos tempos”, disse Mark Grantham, do West Cornwall Ringing Group. “Trata-e de um lugar muito bonito, as pessoas raramente lá vão, mas o caso mostra bem como os seres humanos têm impacto em todos os lugares do planeta.”
Grantham adiantou ainda que tinham começado a contagem de aves há seis anos e foi pouco depois disso que começaram a notar a presença de partes daqueles elásticos às cores. Como faziam sempre viagens curtas, para não perturbar as aves, não tinham conseguido determinar a quantidade de elásticos espalhados por toda a ilha.
Até que, após a temporada da reprodução deste ano, o grupo decidiu olhar mais de perto para o caso. “Numa hora, recolhemos milhares de elásticos e resíduos de pesca”, continua aquele especialista daquela organização de estudo das aves. “A temporada de criação de gaivotas foi muito má em 2019. E este tipo de influência do homem não está a ajudar nada as nossas aves marinhas.” Falta ainda dizer que alguns dos restos de elásticos eram novos e brilhantes, outros desbotados e partidos. “Acho que estes bichos os ‘colecionam’ há décadas”, acresentou, antes de rematar que também tinham encontrado uma gaivota morta – com um anzol na garganta. “É que lugares como a ilha Mullion devem ser santuários para nossas aves marinhas, por isso é angustiante vê-las se tornarem vítimas da atividade humana”.