As folhas das hortênsias podem causar náuseas e dermatite de contacto, e as das estrelas-do-natal provocam irritação nos olhos e dificuldades na visão. O loendro, aquele arbusto com flores brancas e cor-de-rosa que se vê com frequência junto aos separadores das autoestradas, é todo ele tão tóxico que pode originar tonturas, vómitos e uma sensação de pulsação fraca. E a seiva da difembáquia (Dieffenbachia ssp), uma plantinha de interior ornamental que é escolhida por ter fama de purificar mais o ar do que as outras, leva ao edema da língua e da glote e à asfixia.
São muitas as plantas que, por conterem substâncias tóxicas, podem ser prejudiciais – e até perigosas – para a saúde. A maioria exige cuidados especiais no seu manuseamento, e algumas podem mesmo ser desaconselhadas caso existam crianças pequenas ou cães e gatos nas proximidades. “É preciso ensinar as pessoas a terem atenção ao que compram”, diz a engenheira agrónoma Teresa Vasconcellos. “Não comprem pela boniteza, mas pensem no que metem em casa porque há plantas que podem provocar alergias. No outro dia, um colega meu salvou uma pessoa no estrangeiro ao reconhecer uma planta muito tóxica que estava no hall do hotel.”
A difembáquia talvez seja a mais perigosa, com mais acidentes, diz esta investigadora do Instituto Superior de Agronomia, em Lisboa. “Ela pode fazer exsudados depois da rega, bastando tocar no chão que esteja pingado para uma pessoa nem conseguir respirar. E mata gatos.”
Logo abaixo, numa eventual lista das plantas tóxicas que encontramos facilmente em Portugal, Teresa Vasconcellos aponta o loendro (Nerium oleander), nalgumas regiões conhecido como aloendro ou cevadilha. “Já têm morrido pessoas por usarem os seus ramos como se fossem de louro, em espetadas”, conta. “Depende da quantidade de carne que comerem, claro.”
Cinco minutos a ouvir esta engenheira agrónoma deixa-nos com vontade de ir a casa deitar fora várias plantas, a começar pelas hortênsias. Mas há uma frase sua que ajuda a pôr as coisas em perspetiva: “As hortênsias contêm cianeto, sim, mas se elas fossem assim tóxicas o que aconteceria nos Açores, onde até são invasoras? O que é importante”, repete, “é ensinar as pessoas. Explicar-lhes que não devem pôr nada à boca, devem jardinar com luvas e ter atenção com os bichos.”
Incógnitas com os animais
As dúvidas são muitas, sabe-se no Centro de Informação Antivenenos (CIAV), ao qual as chamadas de casos que envolvem plantas chegam habitualmente com perguntas. “Somos contactados sobretudo por causa de criancinhas que metem uma folha na boca e choram porque sentem ardor nas mucosas da boca”, conta Fátima Rato, médica coordenadora deste centro de consulta telefónica na área da toxicologia que funciona na dependência do INEM.
Nos últimos três anos, foram atendidas no CIAV 100 a 150 chamadas por ano, num universo de cerca de 30 mil. “No cômputo geral, são ínfimas aquelas que se referem a plantas, e recebemos do País todo, tanto de hospitais (os colegas normalmente ligam para aqui) como diretamente do público”, nota a mesma médica.
Ainda segundo Fátima Rato, no período do Natal surgem com alguma frequência relatos de ingestão de bagas de azevinho. Quanto aos loendros, “que existem por todo o lado”, lembra, os casos de irritabilidade das mucosas são “mínimos”, considerando a distribuição no País. Porém, embora a prática lhe diga que os casos e a sintomatologia grave são raros, recomenda que se evite ter plantas tóxicas em locais onde o potencial de ocorrência é grande – junto a parques infantis, por exemplo.
As dúvidas são também muitas quando se trata de cães e de gatos, sabe a veterinária Carolina Rebelo, fundadora da Linha Saúde Animal 24, que funcionou entre dezembro de 2016 e junho de 2018. Ao call center chegaram alguns casos de suspeitas de intoxicação por plantas, em que os animais apresentavam sintomas, mas os donos não tinham a certeza do que se passara. “Os sintomas são inespecíficos”, nota. “Normalmente, como há vómitos e diarreia, pensa-se que é um problema gastrointestinal, mas pode ser uma insuficiência renal – e causada por uma planta tóxica.”
É difícil chegar a um diagnóstico, até porque os sintomas podem aparecer quase 24 horas depois. Só uma vez lhe aconteceu terem sido os próprios donos a dar ao cão uma planta altamente tóxica – aloé vera –, que acreditavam ser benéfica. Por sorte, o animal vomitou e sobreviveu, recorda. “Há certas plantas que não se devem ter, sobretudo no caso de haver gatos”, diz a mesma veterinária. “Eles andam por todo o lado, e embora tenham um apetite mais seletivo do que os cães (o meu primeiro cão comeu um esfregão da loiça que cheirava a limão…), podem brincar com as plantas e haver ingestão por brincadeira.”
O médico, alquimista, físico e astrólogo suíço-alemão Paracelso dizia, já no século XVI, que “tudo é venenoso e nada é veneno, só a dose faz o veneno”. A prática de Carolina Rebelo diz-lhe que não há uma proporção da quantidade ingerida com a toxicidade – tem que ver com o metabolismo do animal. E dá um exemplo: “O chocolate faz mal aos cães, mas dois quadradinhos podem não afetar um chihuahua e causar sintomas graves a um labrador.” E, voltando às plantas tóxicas, quem diz cães, diz pessoas.
Cuidado com o cão (e o gato)
Os sintomas de intoxicação por plantas são inespecíficos, alerta a veterinária Carolina Rebelo
1 – Plantas comuns mais tóxicas Lírios, tulipas, aloé vera, palmeira cica, loendro, hera, rícino, rododendro (ou azálea)
2 – Modo de exposição Por contacto, ingestão e/ou inalação
3 – Principal sintomatologia Vómitos, diarreia, dificuldade em urinar, prostração, falta de apetite, abdómen distendido
4 – O que fazer Levar de imediato o animal ao veterinário para fazer um exame de estado geral, e depois estar atento ao aparecimento de sintomas
5 – O que não fazer Nunca dar leite para “limpar”, nem dar azeite, sal ou detergente para induzir o vómito. Também não se deve tentar provocar o vómito pondo os dedos na garganta do animal