Na medicina também há tendências, e hoje, claramente, no tratamento do cancro as soluçõs mais promissoras passam pela imunoterapia, em se estimula ou condiciona o sistema de defesa a eliminar a doença.
Ontem, a agência americana do medicamento, FDA, deu luz verde a uma nova terapia que segue esta linha. É a segunda vez em dois meses em que se aprova uma técnica que recorre à engenharia genética para orientar as defesas no sentido de eliminar o cancro.
O tratamento agora aprovado, Yescarta, mostrou ser eficaz no linfoma de não Hodgkin e os resultados dos ensaios clínicos foram tão promissores que no processo de aprovação pelas autoridades americanas se saltaram etapas.
Para já, a recomendação inclui adultos para quem as hipóteses de tratamento de primeira e segunda linha falharam e para quem praticamente já não há qualquer hipótese de salvação.
Este novo tipo de medicamentos, chamado de droga viva – o primeiro do género, o Kymriah, recebeu luz verde no final de agosto – representa uma forma completamente nova de tratar. E é, no fundo, a concretização do potencial da engenharia genética, em que a ideia base é manipular genes para corrigir defeitos. Neste caso específico, o que se faz é retirar uma enorme quantidade de células de defesa do tipo T do paciente. Em laboratório e com a ajuda de um vírus, estas células são alteradas de forma a que se tornem num exército altamente competente e especializado no combate às células B, também do sistema imunitário e que se tornaram malignas.
Depois de reprogramadas, as células T (designadas por CAR-T) são injetadas no paciente para fazer o seu trabalho e eliminar as células B que se acumulam, de forma descontrolada. Este combate é tão violento que pode deixar o doente à beira da morte. Aliás, durante os ensaios morreram duas pessoas por causa dos efeitos secundários da terapia – mas é preciso recordar que se tratava de pessoas para as quais já tinham sido esgotadas todas as hipóteses terapêuticas.
Mas se sobreviver a esta fase crítica, que chega a obrigar ao internamento numa unidade de cuidados intensivos, o paciente tem boas hipóteses de entrar em remissão total.
O Yescarta tem um custo de €315 mil e foi desenvolvido pela farmacêutica Kite, adquirida recentemente pela gigante Gilead. Para já, a empresa tem capacidade para tratar, no seu laboratório na Califórnia, quatro a cinco mil pacientes por ano. Sendo que a ideia é receber o sangue do doente de todos os hospitais do país e depois enviar a droga viva de novo para o hospital que segue o doente. Para cada pessoa, um medicamento.
A empresa já anunciou que pediu autorização de comercialização à Agência Europeia do Medicamento. Caso esta seja concedida, será construído um laboratório na Europa, para processamento do sangue dos pacientes europeus.
Também está nos planos da Gilead avançar para os tumores sólidos, uma expectativa que já tinha sido demonstrada pela Novartis, a empresa responsável pelo Kymriah. Na mira, os cancros que mais matam: pulmão, mama, próstata e cólon, que juntos representam noventa por cento da mortalidade por cancro.