É a segunda causa de morte em Portugal, e um socorro mais rápido podia, segundo estimativas da Sociedade Portuguesa de Cardiologia, salvar duas a três mil pessoas por ano. Para tal, bastava preparar as crianças e jovens em idade escolar para fazerem manobras de ressuscitação. “Se tivermos a população treinada em reanimação cardiovascular pode-se sustentar a vida até chegar o INEM. Por isso, defendemos que faça parte do programa escolar”, disse à VISÃO o presidente da Sociedade Portuguesa de Cardiologia, Miguel Mendes.
A posição é sustentada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que divulga as contas da Fundação Europeia da Segurança dos Doentes, segundo as quais ensinar ressuscitação nas escolas poderia salvar todos os anos 200 mil vidas na Europa e nos Estados Unidos (EUA).
Sendo uma doença repentina, conhecida como morte súbita, o tempo é a palavra-chave. “Lá porque o coração para, nem todos têm de morrer. A morte súbita não tem de ser uma morte certa. Mas para isso é preciso que o auxílio chegue nos primeiros três minutos, tempo que o cérebro aguenta sem oxigenação”, explica Daniel Ferreira, presidente da Escola de Ressuscitação Cardiopulmonar.
Para quem receia a atuação de crianças perante casos de tamanha gravidade, o cardiologista recorda que a alternativa será sempre muito pior: “O coração para subitamente e, por cada minuto que passa, a probabilidade de sobrevivência diminui 10 por cento. Qualquer coisa é melhor do que não fazer nada”.
As manobras resumem-se a fazer pressão sobre o peito trinta vezes, seguindo-se duas ventilações (o chamado boca-a-boca). Repetir estes gestos até chegar ajuda especializada pode salvar muitas vidas.
Mas mais eficaz ainda é o uso de desfibrilhadores, porque os aparelhos não se limitam ao choque necessário à reanimação cardíaca, também dão instruções orais sobre o que fazer a cada passo. De tal forma que, garante Daniel Ferreira, o sítio mais seguro do mundo para ter uma paragem cardíaca são os casinos de Las Vegas, nos EUA. “Porque estão cheios de câmaras de vigilância e de desfibrilhadores, permitindo prestar assistência em dois minutos. Com isso, a probabilidade de sucesso de uma reanimação é de 80 a 90 por cento”.
Menos aparatosos, mas mais previdentes, alguns países europeus batalham contra a morte súbita há décadas. Na Noruega ensina-se suporte básico de vida nas escolas primárias, enquanto na Suíça não é possível tirar a carta de condução sem ter um curso de suporte básico de vida.
Funcionando como uma bomba, o coração tem uma função elétrica e outra mecânica. Muitas vezes (em mais de 60% dos casos), a parte mecânica deixa de funcionar, mas a elétrica continua ativa. E é nesses casos que o choque elétrico pode ser útil.
Em Guimarães, o Rotary Club espalhou 50 desfibrilhadores pela cidade. Com isso, garante Vitor Sanfins, cardiologista do Hospital de Guimarães, foram já salvas duas vidas. No único local do país com um programa de ressuscitação organizado, a cidade pode evitar “quarenta a cinquenta por cento das mortes”. Se nada for feito, nem massagem cardíaca nem desfibrilhação, a probabilidade de sobrevivência reduz-se a 0,5 por cento.
Com cerca de sete mil casos de morte súbita todos os anos em Portugal, ensinar crianças a interromper o ciclo poderá ser uma forma de evitar o que parece inevitável