Já se sabia que os cães são afetados por uma forma de cancro transmissível sexualmente e ainda que a população de diabos da Tasmânia foi praticamente dizimada por uma forma de cancro da face que passa através das mordeduras. Agora, uma equipa de cientistas do Canadá e da Galiza, em Espanha, percebeu que a transmissão direta de cancro, entre algumas espécies de marisco, é muito mais comum do que se pensava.
O estudo, publicado na revista Nature, foi baseado na análise de populações de mexilhão, berbigão e amêijoa, recolhidas na costa canadiana e espanhola e mostrou que há uma forma de cancro, denominada neoplasia disseminada, que se propaga de animal para animal, através da água do mar. A doença, parecida com a leucemia, afeta estes bivalves, com frequência, e em populações a habitar diferentes partes do mundo. “Os nossos resultados indicam que a transmissão de células cancerígenas contagiosas é um fenómeno muito comum no ambiente marítimo. Os casos de cancros transmissíveis parecem ultrapassar a doença espontânea, pelo menos nas espécies investigadas até agora”, lê-se no artigo.
O contágio deste cancro dos moluscos ocorre quando as células cancerosas saem do animal que está doente e viajam pela água do mar, sendo captadas por bivalves na vizinhança. Antonio Villalba, um dos investigadores espanhóis envolvidos no estudo, explica que “o normal seria que o sistema imunológico do recetor destruísse as células cancerosas. No entanto, estas reproduzem-se, provocando a doença no recetor”.
Os cientistas avançam ainda que tal acontece por o sistema de defesa destes animais ser muito rudimentar, logo mais suscetível a este tipo de contágio. Não há razões para preocupação, em termos de contágio aos humanos, já que estas células doentes, mesmo que ingeridas, seriam logo destruídas pelo nosso sistema imunitário, muito mais robusto.
Em humanos, já se detetou contágio oncológico de mãe para filho, durante a gravidez, entre gémeos, no útero, e depois de um transplante de órgãos.
Agora, os cientistas querem perceber se este fenómeno ocorre desde sempre ou se é resultado de alterações ambientais ou da produção intensiva de bivalves, em sistemas de aqualcultura onde há grande concentração de animais.