
Os ossos são o que restam, em alguns casos
© Jose Gomez / Reuters
No Instituto Nacional de Medicina Legal estudam-se corpos, amostras de sangue, de esperma, de saliva. Por vezes, o único material disponível para análise são os ossos. Aí entra em ação o antropólogo forense, Gonçalo Carnim, o especialista da delegação de Coimbra do INML, que tem colaborado, por exemplo, na identificação das vítimas do franquismo, em Espanha.
Quando tem os ossos à frente, o especialista procura pistas que ajudem a perceber o que lhe aconteceu antes e depois de morrer. Damos-lhe um exemplo:
No sopé de uma zona escarpada, descobre-se um esqueleto. Considerando a zona em que foram encontrados os restos esqueléticos e consultadas as listas de desaparecidos a P.J., julga tratar-se de Maria. A vítima era casada com Hélio e a P.J. suspeita que ele a terá matado. Este parece ser mais um caso de violência doméstica mas o homem afirma que não teve intenção de matar a mulher, que fez tudo para a salvar e que ocultou o seu cadáver por ter medo que lhe atribuíssem a culpa do sucedido.

Os mortos também falam
Marcos Borga
Para conferir a versão de Hélio, Gonçalo Carnim analisou o que aconteceu ao corpo desde o momento em que é cadáver até ao momento em que é encontrado: “quanto tempo terá decorrido desde a morte, se o cadáver sofreu ação de animais necrófagos, etc.”, explica. É preciso avaliar se algumas das fraturas observadas resultam da ação do agressor sobre o corpo da vítima ou da queda do corpo pela encosta da ravina. De seguida, “a análise antropológica teve que determinar se as lesões esqueléticas observadas estão de acordo com a história contada pelo marido, que alega, por exemplo, que a vítima terá caído de costas, desequilibrando-se, enquanto o agredia. Só que são observadas fraturas ósseas na região da face que, além de não serem compatíveis com uma queda de costas, sugerem uma agressão direta e muito violenta.
A história do marido era falsa.
Apesar de só 10% do trabalho feito no INML ser relacionado com as autópsias, esta é, sem dúvida, a parte mais visível do trabalho dos seus peritos.