Hannah tinha 14 anos quando anunciou em casa que queria ir estudar para fora. A mãe bem lhe explicou que ainda era cedo para isso. “E eu estava decidida a ir naquele momento, agora e já”, recorda a rapariga, 18 anos. “Sentia que me faltavam conversas que me trouxessem algo de novo.” Convencida, a mãe pôs-se à procura. Fixou a atenção em Inglaterra – tinham lá família, o que lhe dava mais segurança – mas acabou por se encantar com a instituição melhor classificada no programa IB (International Baccalaureate), que dá equivalência ao 11º e 12º anos.
Situado no País de Gales, o Atlantic foi o primeiro colégio da rede United World Colleges (UWC), criados pelas Nações Unidas logo a seguir à 2ª Guerra Mundial com o objetivo de preparar jovens para criar sociedades de paz. Ali estudaram tanto o rei da Holanda como as duas amigas-acompanhantes de Malala, ali se procura tanto a excelência académica como jovens de enorme mérito humano. Procurados pelas melhores universidades do mundo, atribui ainda bolsas parciais ou totais (de 50 a 100%). As inscrições abrem agora, em janeiro, em agosto começa a grande aventura.
“De repente, estava num sítio onde havia gente de todo o mundo. As minhas três colegas de quarto eram da Mongólia, da China e outra que era meia norueguesa e meia americana”, recorda-se Hannah Nafize, a nossa interlocutora, de uma família da Diáspora, que nasceu em Cambridge e acabou por crescer em Portugalm, a lembrar o lado bom e o lado mau de aprender a viver com gente desconhecida e diferente. “As camas estão a poucos metros de distancia: temos mesmo de saber a lidar com as adversidades, de abdicar de algumas coisas para os outros terem as deles.”
Tinham acabado o 10º ano, área de Ciências (“Achava que ia seguir Medicina”) quando Hannah deixou o conforto da casa dos pais para se instalar neste colégio interno, onde vivem 350 alunos, dos 16 aos 18 anos. “O melhor do programa IB é que podemos ter disciplinas de áreas tão diferentes como Artes, Humanidades, Economia e Ciências, além do Inglês e uma outra língua estrangeira. Acabamos o curso com uma educação completamente holística, sem ter de optar por uma área”, elogia. “Não faz sentido nenhum aprender tudo sobre Biologia e não ficar a saber nada de História.”
Assim, estudou História, Política, Inglês, Francês, Estudos Matemáticos e Ciências Ambientais. Nas aulas, tanto se sentava ao lado de um colega alemão, italiano, ou líbio. “E tanto ouvia a aluna do Bangladesh a contestar o modelo do liberalismo como uma norueguesaa apregoar ‘Estado-Providência é que é, nós é que estamos certos e vocês têm de aprender todos connosco’, e era muito interessante”.
O modelo tem ainda uma vertente de serviço comunitário: “Contribuir para que o mundo à nossa volta fique melhor”, resume Hannah. O Atlantic é conhecido pela sua excelência na formação de nadadores-salvadores – o colégio situa-se num castelo que fica em cima do mar! – mas Hannah optou por outra área: “Tive oportunidade de ajudar a reconstruir um teatro, o único centro de cultura que as pessoas mais velhas daquela região tinham. Partir paredes e sanitas, pintar paredes…” Fez também serviço numa escola primária, onde explicava de onde vinha ou como era a sua casa, e acabou mesmo a mostrar-lhes fotografias. “Fiquei de escrever e enviar-lhes um postal, para eles saberem que eu não desapareci.” Numa outra altura, fiz voluntariado num centro de apoio a sem-abrigo: “Tem de haver algo de errado com uma sociedade, em que há tanto para fazer e deixa que haja gente que vive na rua.”
Não se arrepende de não ter feito serviço de salvamento, mas a verdade é que alguns dos seus antigos colegas estão agora em Lesbos, na Grécia, a bordo de um barco do colégio, a ajudar os refugiados.”Mal começou este drama, o grupo dos antigos alunos logo lançou o desafio: o que é que nós podemos fazer por estas pessoas? Éuma rede para a vida.!
É uma orgulhosa Hannah que nos fala da sua experiência nesta organização, sempre a lembrar que pode ser feita a partir dos 16 anos mas também está aberta a quem já tiver 18, um movimento internacional composto por 15 colégios. Os comités de todo o mundo estão agora a selecionar estudantes num nível pré-universitário, com base no mérito, independentemente da sua situação financeira, etnia, religião ou educação. “Não são só as notas que contam: na inscrição, damos ainda conta das nossas atividades extracurriculares e mandamos dois textos argumentativos”, acrescenta, a lembrar-se que escreveu um sobre a razão de haver tão poucas mulheres no parlamento português e outro sobre o que o colégio poderia fazer por ela e o que ela daria em troca. Agora inscrita no 1º ano deEconomia e Desenvolvimento em Haia, na Holanda, Hannah garante:”O que se traz dos UWC no final é tanto que nunca se fica igual”.
E ainda…
Acabada de cumprir cem anos, em todo o mundo, a Intercultura AFS-Portugal também continua a oferecer intercâmbios a jovens de todo o mundo, cumprindo os desígnios com que foi fundada há mais de cem anos: ajudar a construir um mundo solidário através do intercâmbio cultural entre os povos. Presente em mais de 50 países, desde 1956 que também está em Portugal. As candidaturas decorrem normalmente em novembro. Os candidatos ao programa também devem ter entre 15 e 18 anos, bom aproveitamento escolar e vontade de abraçar novas experiências. Se quiser, pode também inscrever-se como família de acolhimento de um destes jovens que vêm estudar para Portugal.