Para o coletivo de juízes, presidido por Ana Peres, a culpa de Carlos Cruz, condenado a sete anos de prisão, tem “elevado grau”, tendo o arguido agido com “dolo direto”, sem revelar “arrependimento e/ou interiorização da ilicitude da sua conduta”.
O acórdão realça, contudo, que a postura do arguido em julgamento “foi de negação, mesmo quando confrontado perante o discurso das vítimas, cujo depoimento sempre desvalorizou”, lê-se na sentença.
A favor do apresentador televisivo Carlos Cruz o tribunal diz ter “apenas a sua integração social, familiar e económica”, que, contudo, “facilitou a prática dos ilícitos por si cometidos”.
O tribunal considerou Carlos Cruz culpado de duas situações de abusos sexuais sobre menores ocorridas numa casa na avenida das Forças Armadas, em Lisboa, e duas numa casa em Elvas.
Bibi, um “predador sexual”
O ex-motorista da instituição Carlos Silvino revela, através dos abusos sexuais praticados com menores, ser um “predador sexual”, lê-se também no acórdão.
A sentença que condenou Carlos Silvino a uma pena única de 18 anos de prisão diz que a culpa do arguido tem “elevadíssimo grau” e que a dimensão global dos crimes “é intensa, com consequências psicológicas devastadoras para as vítimas”.
Porém, os juízes tiverem em conta o facto de Carlos Silvino ter pedido, em julgamento, desculpa pelos atos praticados, o que revela “alguma consciência da gravidade e das consequências da sua conduta
Jorge Ritto aproveitou-se da “vulnerabilidade” das vítimas
O tribunal que julgou o processo Casa Pia considerou que o arguido e embaixador Jorge Ritto aproveitou “as especiais condições de vulnerabibilidade das vítimas” de abuso sexual neste caso. O acórdão salienta que também quanto a Jorge Ritto “a dimensão global da ilicitude é intensa” e que o diplomata agiu com “dolo direto” na prática dos ilícitos.
A sentença frisa que a postura do embaixador – que durante o julgamento se remeteu ao silêncio – “não foi colaborante”, revelando “ausência de arrependimento e/ou interiorização da sua conduta, o que não se confunde com a sua alegada homossexualiadade, precisamente por estarem em causa realidades bem diversas”.
Cargo agrava culpa de Manuel Abrantes
O acórdão do processo Casa Pia atribui especial censurabilidade à culpa do arguido Manuel Abrantes nomeadamente pelo “aproveitamento absoluto da posição que ocupava na Casa Pia”.
Na determinação do grau de culpa do ex-provedor adjunto da Casa Pia, o tribunal penalizou-o pela “desconsideração do seu dever de garante perante jovens em formação” entregues à instituição de acolhimento.
“O arguido colocou em causa, com a sua conduta, o bom nome da Casa Pia que o acolheu como profissional, destacando-o entre os pares”, lê-se no documento.
Os juízes do processo Casa Pia concluíram ainda que o ex-provedor adjunto Manuel Abrantes protegeu Carlos Silvino, que teve liberdade e impunidade para praticar abusos sexuais com menores casapianos.
No acórdão final, o coletivo considerou que existiu uma relação “diferente” entre os dois arguidos, ambos condenados por abuso sexual de menores, que levou a concluir que houve “uma situação de ‘proteção'” do ex-provedor ao seu funcionário.
Ao longo dos anos em que trabalhou na instituição, Carlos Silvino teve várias “sanções disciplinares e advertências”, mas ao mesmo tempo foi progredindo na carreira e sendo promovido, “criando um sentimento de superioridade e impunidade”.
Hugo Marçal sem arrependimento
Quem também não mostrou arrendimento foi o advogado Hugo Marçal. “A sua postura em julgamento não foi de todo colaborante, mas antes desculpabilizante”, lê-se na sentença, a qual refere que o arguido sempre negou os factos.
Hugo Marçal foi condenado a seis anos e dois meses de prisão efetiva, tendo o coletivo de juízes feito referência à sua “culpa em elevado grau”, “especial censurabilidade” e “manifesto aproveitamento da vulnerabilidade” das vítimas.
Ser médico aproximou Ferreira Diniz das vítimas
Os juízes do processo Casa Pia consideraram que o arguido João Ferreira Diniz utilizou a profissão de médico como fator de aproximação às vítimas de abusos sexuais.
O tribunal entendeu ser censurável cada crime praticado pelo arguido, a juntar ao aproveitamento da sua condição de médico, “fator de algum modo determinante na ausência de qualquer suspeição inicial sobre si por parte das vítimas”.
Os juízes consideraram que o arguido cometeu abusos sexuais “com dolo direto” e que a sua postura em julgamento “não foi de todo colaborante, mas antes de negação perante os graves factos” de que era acusado, segundo o acórdão entregue hoje aos advogados e a que a agência Lusa teve acesso.