O confronto entre os líderes do CDS e da Iniciativa Liberal prometia ser um momento tenso e, mesmo assim, as previsões ficaram aquém da subida de temperatura no estúdio da RTP3, nesta tarde de quarta-feira. Francisco Rodrigues dos Santos acusou o sentimento de ameaça que os liberais representarão para o seu partido e perturbou a habitual clareza no discurso de João Cotrim de Figueiredo, interrompendo constantemente o segundo com insultos fáceis e vincando bem as diferenças entre os dois, essencialmente no domínio das políticas sociais. Sempre atrás no cronometro do debate, o líder da Iniciativa Liberal (IL) passou o tempo a defender-se e só se revelou no final, quando Francisco Rodrigues dos Santos deixou a porta entreaberta para um possível acordo entre os dois e Cotrim de Figueiredo se indignou com a proposta.
Francisco Rodrigues dos Santos agarrou-se com unhas e dentes e tentou gastar o máximo tempo possível do debate a falar sobre políticas sociais, onde acreditou que poderia tirar o tapete a Cotrim de Figueiredo. Já o ponto de consenso foi a cerca sanitária traçada por ambos a acordos com o Chega.
O Estado Social
“Somos muito parecidos com IL, menos quando a IL deixa de se preocupar com as pessoas e olha exclusivamente para os mercados”, começou por atacar o líder do CDS, que, ao contrário do que sugeria no início da frase, não ia à procura dos pontos comuns. Francisco Rodrigues dos Santos acusou Cotrim de Figueiredo de negligenciar as “pessoas que não tiveram as mesmas oportunidades perante a vida” e de querer acabar com o Estado Social; ao contrário CDS que defende “as famílias mais pobres”. “Chicão” tentou ainda colar a IL à esquerda, particularmente ao BE, acenando com os exemplos da defesa da despenalização da eutanásia, das drogas leves e da liberalização da prostituição – “são em tudo iguais à esquerda, tirando na economia”, disse.
Por sua vez, João Cotrim de Figueiredo gabou-se de ser “atacado pela esquerda e pela direta da mesma maneira” para reforçar a ideia de que o seu partido não aceita rótulos e desmentiu a acusação de insensibilidade para com os cidadãos mais vulneráveis. No entanto, não aproveitou o seu tempo para dar exemplos de propostas sociais contidas no programa, por apresentar da IL, mas sim para alterar o foco da provocação: “Temos de criar condições para que as economias se desenvolvam e que haja menos pessoas vulneráveis. O crescimento económico tem de estar no centro das nossas preocupações”.
Salário Mínimo Nacional
Questionados pelo moderador, o jornalista João Adelino Faria, sobre o que pensam da proposta do PS para subir progressivamente o salário mínimo nacional até aos 900 euros, Cotrim de Figueiredo conseguiu recuperar a clareza, que lhe faltou noutros momentos do debate, contrastando com a resposta evasiva do líder centrista.
O presidente da Iniciativa Liberal rejeitou a proposta, justificando-se com a ideia de que a produtividade nacional não acompanharia a subida dos salários. “O nosso problema, em Portugal, é o salário médio”.
Já “Chicão” optou por não responder diretamente, dizendo: “a decisão não é minha”. “Os aumentos do salário mínimo nacional devem ser decididos em sede de concertação social”, com o acordo mutuo de empresas e de trabalhadores.
Acordos parlamentares
Com o Chega? “Não”, foi a resposta de ambos. Este foi o único limite claro traçado pelos dois líderes partidários, com Cotrim de Figueiredo a explicar que não vê “cenário nenhum em que o acordo dos Açores seja viável no continente” e a sublinhar que no arquipélago era necessário colocar fim à governação do PS.
Francisco Rodrigues dos Santos disse ainda que “um voto no CDS não servirá para [apoiar] um governo do bloco central” e abriu a porta a uma conversa com a IL: “se o meu primo moderninho deixar de fazer concessões à extrema esquerda, eu estou disponível para me entender com o João Cotrim de Figueiredo”.
O líder da Iniciativa Liberal que tratou por “tu” Rodrigues dos Santos durante todo o debate escolheu este momento para recuar. Embora não tenha respondido com um “não” direto ao convite do líder do CDS, acusou os centristas de não fazerem um esforço para ouvir as ideias dos outros, de procurarem entendimento apenas nos seus termos e que será por isso que o partido vai perdendo tantos quadros qualificados – alguns para a IL, rematou Cotrim de Figueiredo. O que aguçou Rodrigues dos Santos para uma última provocação: “A IL é a Ruth Marlene da política: pisca à esquerda e pisca à direita”.
As frases do debate
Francisco Rodrigues dos Santos: “Nós não somos capitalistas selvagens, nem colocamos a economia à frente das pessoas”.
João Cotrim de Figueiredo: “Rodrigues dos Santos é o líder mais novo e o que tem a cabeça mais velha”.