De um lado, os “arranjinhos” que conduzem à estagnação e ao retrocesso. Do outro, “a convergência necessária para a solução dos problemas”. É aqui que se coloca a CDU. “Pode haver incerteza quanto ao resultado das eleições, mas não há dúvida sobre qual é a política da direita (…), que agrava os problemas do país e castiga os trabalhadores e o povo. E também não há dúvida de que se prepara o encosto do PS ao PSD e que a única maneira de o contrariar é reforçar a CDU”, sublinhava Jerónimo de Sousa, no discurso lido ao concluir a tradicional arruada por Santa Catarina, no Porto, no último dia de campanha, antes de partir para Braga, para o comício final. O fantasma de um bloco central foi predominante no discurso do secretário-geral do PCP. “Bem podem fazer de amuados, bem podem fingir discórdias, mas o que ensaiam são acordos para, pela mão de um ou de outro, dar andamento à política de direita. Bem pode o PS dizer que quer derrotar a direita quando já anunciou que pode vir a governar lei a lei com o PSD ou quando vemos Augusto Santos Silva a propor um acordo de cavalheiros para PS e PSD poderem governar à vontade”, apontou, numa intervenção em crescendo, que ocultava a saúde débil. Denunciou “a velha e gasta alternância sem alternativa (…), essa ardilosa manobra que pretende subverter a natureza destas eleições que visam a escolha de 230 deputados. Iludem que são as maiorias que se formam na Assembleia da República que, e muito justamente, determinam os governos. Que são várias as soluções possíveis. A vida mostrou-o em 2015”.

O independente Manuel Loff, historiador e professor universitário, que aparece em terceiro lugar na lista da CDU ao círculo eleitoral do Porto – em 2019, a coligação só elegeu duas deputadas pelo Porto, Diana Ferreira e Ana Mesquita – já tinha tomado anteriormente a palavra para atacar as manobras de distração dos outros partidos políticos: “Não vale a pena qualquer encenação em campanhas eleitorais, a falar desde o anel de rubi [alusão à música de Carlos Tê e Rui Veloso que André Ventura dedicou ao líder do PSD], ao gato de Rio [o já famoso José Albino], o que temos de discutir é como se resolvem os problemas deste País”. Recordou os desejos de Abril por concretizar, como a saúde e a educação universal e gratuita, as pensões de reforma digna, ou o trabalho “como dimensão da nossa felicidade, e não um inferno”. “Em todas as grandes mudanças que acontecerem no País, as que trouxeram felicidade e condições de vida para todos, esteve a CDU, em anos e anos de luta, sem vender a alma, sem desistir, sem se deixar comprar”, defendeu. E apelou à memória de quem testemunhou a “arrogância e o autoritarismo” da governação de Rui Rio na câmara municipal do Porto, palavras aprovadas com uma longa vaia.

Os militantes começaram por se juntar na avenida dos Aliados e subiram depois a rua 31 de Janeiro, onde os aguardava, no topo, Jerónimo de Sousa, para a seguir percorrer a rua de Santa Catarina, ainda debilitado após a operação de urgência à carótida interna esquerda, que o impediu de acompanhar durante 14 dias a campanha. A arruada esteve longe dos banhos de multidão com que, no mesmo local e também na reta final da campanha, foram acolhidos Rui Rio e António Costa. Aliás, a campanha comunista para estas legislativas, face à pandemia, optou por atenuar os contactos de rua e este fim de tarde não foi diferente. Sem paragens, “a CDU avança, com toda a confiança!”, a frase que se ouviu gritar repetidamente ao longo do percurso. Nas primeiras filas, avistavam-se caras conhecidas do partido como Diana Ferreira, que volta a encabeçar lista da CDU ao círculo eleitoral do Porto, Jorge Machado, mandatário da candidatura no distrito, Ilda Figueiredo, vereadora comunista na câmara municipal do Porto, Alfredo Maia, antigo presidente do Sindicato dos Jornalistas (13º na lista), Honório Novo, outrora deputado do PCP na Assembleia da República, ou José Pedro Rodrigues, vereador comunista na câmara municipal de Matosinhos. “Morto por dar um abraço ao Jerónimo” estava Manuel Soares, 75 anos, empregado da indústria hoteleira pertencente à concelhia de Penafiel, vestido a rigor, com gravata vermelha, alfinete do PCP na lapela e gaita improvisada com autocolante da CDU, mas teve de manter a devida distância. Isso não o fez abrandar o passo, tão lesto como o dos representantes da Juventude Comunista que deram o tom de festa à última arruada.