Com menos de um mês de audições da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à gestão da TAP, o deputado comunista Bruno Dias lamenta que os portugueses possam interpretar o que tem sido dito ali como um exemplo da má gestão do Estado. O coordenador do PCP naquela CPI lembra que foi a manutenção da companhia como empresa estatal que impediu o seu fecho e pede que, se alguém tiver que ser responsabilizado pelo que tem estado a ser revelado nas últimas semanas, que sejam os gestores, políticos e partidos a darem explicações pelas condições em que está a empresa.
“Se estas pessoas [que têm passado pela CPI] não têm perfil para gerir uma empresa pública, não têm perfil para defender o interesse público, daí não podemos concluir que o Estado não tem perfil nem capacidade para gerir uma empresa“, apontou Bruno Dias, esta quinta-feira, no Irrevogável, o podcast de entrevistas da revista VISÃO.
O deputado pediu cautela: “tem sido avassalador quando vemos a atuação política e atuação no plano individual, de responsabilidade individual de antigos e atuais governantes. Mas, daí concluir se que o Estado gere mal…Não; quem gere mal são aquelas pessoas. Devemos responsabilizar essas pessoas e esses partidos. Ou devemos entregar isto tudo aos privados, para ser debaixo da mesa? O problema está como se transmite [o que aconteceu na empresa]. O que verificamos é que foi trágico um conjunto de opções estratégicas, que penalizaram no plano económico a empresa – a partir de favorecimentos, a partir do interesse dos próprios acionistas (como opções de investimento que ainda agora estão a custar bem caro). A fatura está a ser paga pela TAP e por todos nós“.
Horas depois do chanceler alemão, Olaf Scholz, ter dito, à margem da festa dos 50 anos do PS, que, se não fosse a pandemia, a Lufthansa já teria ficado com a companhia aérea portuguesa, Bruno Dias lembrou que, desde o início do século, que a empresa tem tido a sina de o Estado a querer entregar a privados.
“É preciso não esquecer que a TAP esteve para ser privatizada no ano 2000, e se tivesse acontecido isso já não existia, como aconteceu à Sabena, da Belgica – que foi comprada pela Swissair e fechou. Como não vendemos a TAP à Swissair, ainda cá a temos. Depois veio um ciclo muito longo de gestão pública, preparando a privatização, com estratégias como a famosa expansão para o Brasil, que, com algumas vantagens, pelo meio, foi um a situação verdadeiramente desastrosa, que mais prejuízos deu do que a pandemia – o negócio da Varig Manutenção”, recordou, dando como exemplo a aquisição da Sorefame – antiga empresa ferroviária estatal -, por parte da alemã ADtranz, que “comprometeu-se em trazer modernidade e investimento” e a “Sorefame já não existe hoje”.
Relativizando as contas positivas inéditas da empresa, relativas a 2022, Bruno Dias garantiu que o PCP sempre alertou que as previsões do Governo, com base em estimativas da Associação Internacional de Transporte Aéreo [IATA], que conduziram ao plano de reestruturação da TAP, eram “conservadoras”. Por isso, recusa aplaudir os resultados positivos de forma enérgica.
“Temos de ser cuidadosos e não embandeirar em arco as contas da TAP, porque o que fazia falta à companhia era um plano de contingência, que fizesse atravessar aquele período mais gravoso da crise pandémica. Por isso, sempre dissemos que as estimativas do governo e da IATA, de recuperação do setor, eram demasiado conservadoras e que a recuperação iria acontecer antes do momento; e aconteceu”. Ou seja, deixando no ar que “os resultados não são fruto da gestão, mas das circunstâncias”, fez questão de frisar que parte dos resultados também vivem dos “ataques aos direitos dos trabalhadores da companhia” e do fim da aposta insustentável em que se tornou a empresa de manutenção no Brasil, que a TAP comprou à falida VARIG.
Quando ainda não eram conhecidas as declarações do ministro das Finanças, Fernando Medina, que disse no Parlamento que, afinal, “não há nenhum parecer” que o Governo tenha pedido para demitir a CEO e o chairman da TAP, e que, por isso, não há nenhum documento a remeter à CPI, apontou que a discussão nos últimos dias sobre esse caso foi “deplorável e caricata”.
“As informações considerada necessárias pela CPI devem ser facilitadas pelas várias entidades – seja o Governo, sejam as imprensas – e isso o quanto antes. Porque é preciso bom senso”, defendeu o comunista quanto ao futuro desta CPI.
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