Com José Matos Fernandes e Pedro Siza Vieira já fora do governo, João Galamba, o novo ministro das Infraestruturas, é o último governante que integrou um pequeno núcleo de políticos suspeitos numa investigação aberta pelo Ministério Público ao projeto do hidrogénio verde, em Sines. Na qualidade de secretário de Estado da Energia, João Galamba foi até alvo de escutas telefónicas mas, segundo apurou a VISÃO, ainda não foi ouvido no respetivo processo, seja na qualidade de testemunha ou de arguido.
Em novembro de 2020, a Procuradoria-Geral da República confirmou a existência de um inquérito-crime relacionado com o projeto do hidrogénio, referindo, à época, não existirem quaisquer arguidos constituídos. Além de João Galamba, também o antigo ministro José Matos Fernandes esteve sob escuta. E foi na sequência destas interceções telefónicas que os procuradores recolheram várias conversas com o primeiro-ministro, António Costa.
Como, por lei, compete ao presidente do Supremo Tribunal de Justiça validar as escutas telefónicas com o primeiro-ministro, presidente da Assembleia da República e Presidente da República, as conversas foram remetidas para o então presidente do STJ, o juiz conselheiro Joaquim Piçarra, que validou uma, ordenando a destruição das restantes.
Já as conversas que João Galamba e José Matos Fernandes possam ter tido com empresários, membros do gabinete e outras pessoas com interesse no projeto do hidrogénio ficaram transcritas no processo 581/19 do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) e que poderão causar um forte embaraço ao governo de António Costa, ainda que o primeiro-ministro tenha referido, esta segunda-feira, que os novos ministros “dão garantia que não haverá perturbação” no seu Executivo.
Quem também, segundo confirmou a VISÃO, ainda não foi ouvido foi o empresário holandês Marc Rechter, um empresário holandês que terá apresentado, pela primeira vez, ainda em 2019, ao governo português um primeiro projeto para a produção e exportação de hidrogénio verde. Porém, este empresário ter-se-à visto confrontado com a inclusão de outras empresas, como a EDP, Galp, REN e Martifer, a convite do governo português.
A investigação ao caso do projeto do hidrogénio está a cargo do procurador João Paulo Centeno, que nos últimos anos tem coordenado um grupo de magistrados que se dedica à investigação de casos de tráfico de droga e criminalidade violenta, estando afastado das investigações à criminalidade económico-financeira. Este magistrado foi, refira-se, o autor da acusação contra o chef Ljubomir Stanisic por suspeitas de corremper agentes da PSP com garrafas de vinho. O magistrado do Ministério Público é atualmente o ponto de contacto da “rede de procuradores anti-drogas” da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP).
O processo segundo contou o próprio João Paulo Centeno num inquérito de violação do segredo de justiça, aberto após as primeiras notícias de novembro de 2020, foi impulsionado pelo anterior diretor do DCIAP, Albano Pinto, nomeando uma equipa “da sua confiança pessoal”. Os procuradores deste processo foram, segundo as palavras de João Paulo Centeno, “escolhidos a dedo” pelo então responsável do DCIAP, tendo preservar ao máximo o secretismo da investigação. Porém, como revelou João Paulo Centeno, numa das escutas telefónicas surgiu uma pista de que, afinal, alguém já saberia da investigação em curso.