O consenso é fácil na análise dos politólogos, a quem a VISÃO pediu que evitassem um zapping durante a tarde desta quinta-feira para terem os olhos no debate de política geral com o primeiro-ministro, num formato que veio substituir as discussões quinzenais. Quer para Bruno Ferreira da Costa, docente de Ciência Política da Universidade da Beira Interior, quer para José Palmeira, também docente na mesma área, mas Departamento de Ciência Política da Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho, tratou-se de um embate morno, não tanto por responsabilidade de António Costa, mas pela falta de uma oposição de corpo inteiro.
Segundo Ferreira Costa, “mais uma vez houve uma gestão eficaz dos tempos pelo primeiro-ministro, que claramente estava preparado para responder a todas as questões que marcaram a rentrée política”. Em contraste com uma prestação acanhada do PSD, devido à “incapacidade de Miranda Sarmento em afirmar um discurso assertivo e uma retórica eficaz, mostrando uma falta gritante de técnica parlamentar”. “Este debate foi muito marcado pelo facto de estarmos na véspera da entrega da proposta do orçamento do Estado, não tendo o primeiro-ministro querido antecipar nada de importante”, considera, por outro lado, José Palmeira.
Ferreira Costa estabelece uma linha temporal do debate, destacando o “início rompante do Chega, que acabou por esvaziar a capacidade dos outros partidos sobre vários centros de polémicas – como a contratação de Fernando Medina, Costa e Silva, Pizarro e a ministra da Coesão, sem que André Ventura se tivesse focado num só tema”. Isto numa discussão em que considera ter havido sinais claros de uma “agonia do grupo parlamentar do PSD”, perante “a impreparação do líder da bancada”, que até tem “handycap que parece evidente”, mas cujas “publicações tornaram-se o centro de debate, que deveria ser o PSD”.
Para Palmeira, “este debate revela uma característica comum a outros, que se acentuou já nesta maioria absoluta, que é a de que não vale a pena procurar um confronto entre o primeiro-ministro e a oposição. O primeiro-ministro só responde ao que quer. E nisso, o Rui Rio tinha razão: ou estes debates favorecem Costa ou são muito neutros. Porque o primeiro-ministro domina muito bem os dossiês, ao contrário da oposição”.
Ainda assim, José Palmeira realça que “deste debate revelou uma fratura exposta que é o ministro da Economia, que tem sido torpedeado por ministros e secretários de Estado. O primeiro-ministro elogiou o percurso do ministro, mas não elogiou a sua tese sobre o IRC”.
Eis então o semáforo deste debate:
Vermelho
- “A oposição, principalmente o PSD que, como maior partido da oposição, apesar de contar com uma nova liderança parlamentar, que deveria marcar o ritmo da oposição, não está a conseguir fazê-lo”, aponta Bruno Ferreira Costa.
- “O debate em si esteve muito morno. Os partidos cumpriram com o que é a sua agenda. Mas diria que o Chega, que arrancou com o debate, acabou por não conseguir ter grande impacto com a sua estratégia – que foi um ‘chover no molhado’ e uma trica politica só tem efeito junto de uma bolha mediática”, considera José Palmeira.
Amarelo
- “Às esquerdas ainda não encontraram o tom desde o fim da gerigonça. Há um certo desgaste dos lideres da esquerda – Jerónimo de Sousa e Catarina Martins. É quase repetitivo o que dizem. Já quase sabemos de antemão o que vão falar. Antes, conjuntura favorecia-os. E agora, em que uma situação de crise poderia favorece-los, há ali um desgaste”, classifica Palmeira.
- “Ao próprio debate, por ser exageradamente morno, quando estamos perante uma grave crise social. Parece que há um sentimento amorfo e que as importantes passam ao lado de todos os partidos. E depois uma perda de um certo sentido de rumo do BE e do PCP, ainda à procura do tom certo”, diz Bruno Ferreira Costa.
Verde
- “Para António Costa. Foi mais uma tarde de passeio. É a força motora deste Governo. Pode não ter a equipa ao mesmo nível, com vários ministros com dificuldades de afirmação. Costa chegou ao debate e conseguiu alavancar algumas criticas complicadas – e, ainda por cima, num dia difícil, causado pelas buscas à Secretaria da Presidência do Conselho de Ministros. Mas também há um sinal verde para a capacidade da Iniciativa Liberal ter conseguido colocar ‘truque’ como uma das palavras do debate”, conclui Ferreira Costa.
- “Poderia ser o primeiro-ministro a merecer um sinal verde, mas não se destacou, além de não revelar nada ou anunciar nada. Não disse nada de novo. Tem um estilo que não é típico de um primeiro-ministro, porque quando confrontado revela uma arrogância nada normal para a gravitas que deve ter um primeiro-ministro. Algo notório quando substituiu as anteriores críticas ao mandato de Passos Coelho, para fragilizar o PSD, por um livro escrito pelo líder paramentar, que não é sequer o programa do PSD”, argumenta José Palmeira.