Era o segredo autárquico do Chega mais bem guardado, mas aqui se levanta o véu: António Fonseca, presidente da União de Freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, São Nicolau e Vitória (Centro Histórico), é o provável cabeça-de-lista do partido de direita radical populista à Câmara do Porto, soube a VISÃO junto de fontes daquela força política.
Para já, o visado foge do tema: “É prematuro falar sobre isso”, reage, embora admita que a hipótese está em cima da mesa. “Nos próximos dias decidirei, há outras hipóteses. Como sempre aconteceu no meu percurso autárquico, não me faço convidado, sou convidado. Portanto, a acontecer algo, nunca serei eu a fazer o anúncio oficial”, explica António Fonseca que, mesmo sem pretender alongar-se, desvaloriza o carimbo de extremista associado ao Chega: “Não é nazi, pois não? Se fosse ficava preocupado, mas é um partido legal e vivemos num País livre. De resto, nem sempre a realidade nacional se aplica ao terreno autárquico”, adverte. Quanto a Rui Afonso, líder distrital do Chega, remete a decisão para o presidente do partido: “Sugeri vários nomes e o assunto está nas mãos do André Ventura, que ainda não me comunicou quem será o candidato”, explica. No início de maio, António Fonseca recebeu na junta de freguesia os líderes distrital e concelhio do Chega, mas a conversa, resumiu, visou apenas a “apresentação de cumprimentos”. Há dias, na revista Sábado, o deputado e líder do partido garantiu que a escolha para candidato à Câmara do Porto recairia numa “pessoa conhecida e respeitada” na cidade. A apresentação, essa, será sábado, 12, pelas 17 horas, na sede do Chega na Invicta.
Um autarca polémico
António José Gonçalves Fonseca encabeçou a lista do movimento independente de Rui Moreira nas autárquicas de 2013 e 2017 à União de Freguesias do Centro Histórico e ganhou ambas. O autarca, contudo, tem mantido uma relação tensa com a maioria camarária. Em 2015, o presidente da Câmara do Porto retirou-lhe a confiança política com base no argumento de que Fonseca assumira posições políticas e decisões executivas que se afastavam dos princípios de “lealdade e solidariedade” do movimento. Em 2017, tudo ficaria aparentemente sanado com a recandidatura do autarca, mas, há poucos meses, a polémica reacendeu-se: confrontado pela oposição com dúvidas acerca da utilização de verbas do orçamento colaborativo da freguesia para outros fins, Rui Moreira decidiu retirar uma proposta de transferência de dinheiro para a junta liderada por António Fonseca por tender a concordar com as críticas. O ambiente nas assembleias de freguesia do Centro Histórico é, de resto, escaldante, ou não tivesse o presidente da sido alvo de duas moções de censura.
Em abril de 2014, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto determinou a perda de mandato do autarca por ter sido candidato à junta de freguesia já depois de declarada a sua insolvência pessoal. “Quem não dispõe de capacidade para gerir o seu próprio património, também não reúne condições para gerir o património público”, resumia a sentença. Mas em julho desse ano, os juízes do Tribunal Central Administrativo do Norte anularam a decisão, concedendo a António Fonseca o uso de todos os seus direitos, uma vez que tinham cessado todos os efeitos resultantes do processo de insolvência.
Bem relacionado com as forças policiais e os empresários de bares e discotecas localizados, sobretudo, nas zonas ribeirinhas da Invicta e de Gaia, António Fonseca lidera a Associação de Bares da Zona Histórica do Porto (ABZHP). Foi, aliás, o primeiro subscritor de uma petição enviada há meses à Assembleia da República, na qual reivindica apoios financeiros do Estado para o setor, alegadamente prejudicado pelos efeitos da crise provocada pela pandemia.
Nessa área de negócio, um dos mais próximos do autarca é Manuel Carvalho, proprietário da popular Taberninha do Manel e de alojamentos turísticos, cujas simpatias pelo Chega e por André Ventura são assumidas e conhecidas. Apoiante da candidatura de Hugo Ernano pelo Chega no Porto nas legislativas de 2019, o empresário confessou, perante testemunhas presentes no jantar-comício de Ventura em Leiria, em agosto de 2020, ter financiado a campanha eleitoral daquele militar da GNR, condenado pela morte de uma criança de etnia cigana durante uma operação policial. Em maio do ano passado, Manuel Carvalho chocou os presentes numa conferência de Imprensa promovida pelo próprio António Fonseca em nome da AZBHP para reivindicar apoios para os empresários desta área de negócio prejudicados pela pandemia. Na ocasião, revelou ter recorrido ao lay-off, enviando para casa 25 funcionários, mas recusou descapitalizar-se ou vender prédios “para pagar ao pessoal”. Na mente, entretanto, ainda tinha a recordação do caos que vivera no Brasil semanas antes por causa da pandemia: “Fui logo para a casa de praia para não me chatear”. A VISÃO tentou no domingo, 6, obter do empresário próximo do Chega uma reação à provável escolha de António Fonseca para candidato à Câmara do Porto, mas o telemóvel esteve sempre desligado.