Foi depois de um conselho de ministros que se prolongou pela noite de sábado que o primeiro-ministro, António Costa, anunciou ao país o que aí vem a partir da meia-noite de segunda-feira, quando entra em vigor o estado de emergência. É nesse momento que se impõem regras diferentes para quem vive nos 121 concelhos do país com maior risco de propagação da pandemia. À semelhança do que acontece numa série de outros países europeus, o governo decretou um recolher obrigatório, mas com nuances: durante a semana será entre as 11 da noite e as cinco da manhã do dia seguinte; ao fim de semana será a partir da uma da tarde. Tudo para que se possa preservar o direito a estudar e a trabalhar.
“Temos a nítida noção de que o convívio social tem um contributo muito importante para a disseminação” do contágio e que a propagação se desenvolve no período pós-laboral, afirmou ainda António Costa, no final da reunião do Conselho de Ministros extraordinária, depois de sublinhar várias vezes que “a situação é muito grave e é preciso fazer tudo para controlar a pandemia.” O que vai então mudar mais nas nossas vidas?
Por estarmos em estado de emergência, o Governo pode fazer tudo o que quiser?
Não. Ao abrigo do estado de emergência o Governo pode aprovar as medidas que entender necessárias para proteger a saúde pública, mas sempre com esse objetivo em vista. É nesse âmbito que avança a proibição de circulação na via pública durante determinados períodos do dia.
Mas o que foi agora anunciado é mais restritivo do que em março?
António Costa assumiu, desde logo, ao anunciar estas medidas, que não têm apenas uma “natureza preventiva”, e até contempla medidas “mais intensivas” ao fim de semana do que em março. Mas fez questão de sublinhar que, pelo menos para já, estamos ainda e apenas só a falar dos próximos dois fins de semana.
Que exceções há a essa proibição de circulação na rua às horas anunciadas?
O desempenho de atividade profissional, a obtenção de cuidados de saúde, a assistência a terceiros, a frequência de estabelecimentos de ensino ou abastecimento de bens permitem que se possa sair à rua nas horas do recolher obrigatório. E ainda, tal como durante o estado de emergência, na primeira vaga da pandemia no país, para um passeio higiénico perto de casa e para levar os animais de estimação à rua.
E a atividade cultural e os restaurantes, vão ser outra vez dos mais afetados?
Sim, isso é assumido. Ainda assim, António Costa considera que o horário de encerramento às 11 da noite, durante a semana, permite que mantenham as portas abertas – e ainda ao fim de semana, de manhã. A partir daí, podem continuar a servir refeições, mas em modelo take-away.
Perante este apertar das medidas, devido à assumida falta de meios no combate à pandemia, vamos ser chamados a ajudar?
Mobilizar mais pessoas é, efetivamente,outra das opções do governo. A partir de agora, quaisquer trabalhadores de entidades públicas, privadas, setor social ou cooperativo podem ser mobilizados pelas autoridades competentes – independentemente do tipo de vínculo e mesmo não sendo profissionais de saúde – para apoiar as autoridades de saúde.
Quem for requisitado, vai fazer exatamente o quê?
Não sendo trabalhador especializado, o apoio pedido será para outras áreas igualmente importantes para o combate à pandemia e onde se têm registado falhas e atrasos – como a realização de inquéritos epidemiológicos, o rastreio de contactos e ainda seguimento de pessoas em vigilância ativa.
E podem obrigar-nos a fazer testes à Covid-19 ou medir-nos a temperatura?
São outras duas possibilidades. O controlo da temperatura corporal pode ser pedido para acesso e permanência aos locais de trabalho, estabelecimentos de ensino, meios de transporte e espaços comerciais, culturais e desportivos. Já a realização de testes de diagnóstico está prevista para lares, entrada e saída do território nacional, estabelecimentos prisionais e também de cuidados de saúde.
Em relação às escolas, há risco de voltarem a fechar portas?
Aí o governo é perentório: neste momento, não está considerado nenhum encerramento das escolas e essa é uma das prioridades. Além de não se pretender nova interrupção generalizada na atividade profissional, outra das linhas mestras das medidas anunciadas é “garantir que o ano letivo não vai sofrer sobressaltos”.
Isto também quer dizer que vamos mesmo ter um Natal como até agora?
Esse é um dos objetivos, admitiu ainda o primeiro-ministro – nas suas palavras, trata-se de “ter um Natal o mais normal possível”. Mas, frisou, só “se todos cumprirmos estritamente estas medidas” e com isso “conseguirmos achatar a curva da pandemia”.
E se, depois disto tudo, mesmo assim não chegar?
Essa é para já a grande incógnita. António Costa concedeu que as medidas anunciadas são “duras, dolorosas, e fortemente restritivas da liberdade das pessoas – mas também não teve pejo em reconhecer que, se não resultarem, podem obrigar as autoridades a tomarem medidas mais drásticas.