Chegou a Belém com 45 minutos de atraso. O percurso desde o Pedro Nunes, na Avenida Álvares Cabral, em lisboa, foi relativamente rápido. Demoradas foram as selfies, sempre as selfies.
Mas lá conseguiu chegar. Estacionou o carro à porta do museu da Presidência da República e atravessou a rua, fora da passadeira, para ir ter com outros jovens, que o esperavam ao lado da equipa da CAIS: os “manda chuva”, como lhes chamou, e ainda José Barros e António Pia, os dois vendedores com quem percorreria as ruas mais movimentadas de Belém.
Mas eram quase duas da tarde e o Presidente precisava de uma pausa. Sentou-se numa esplanada, pediu a habitual sandwich de queijo (nem teve de dizer “sem manteiga”) e o seu Sumol de ananás. José Barros e António Pia acompanharam-no na sandwich (uma de queijo, outra de fiambre) e no sumo. Enquanto esperavam, passou umas notas de euros para as mãos dos vendedores e começou a distribuir a revista CAIS aos alunos que o seguiam. Depois, o que distribuiu pela mesa foram toalhetes… e muita conversa. Trocou palpites sobre onde se vendia mais – “no Chiado deve ser bom”, “nas avenidas novas já se vendeu melhor” – e sobre o número que está, ele próprio, a preparar. Dedicado à juventude, terá “uma reportagem, uma reportagem fotográfica, o depoimento de um jovem e outro de um menos jovem, as aventuras de um jovem cá dentro e de outro, lá fora”. Só não sabe ainda se as pessoas que conta convidar para participar no desafio aceitarão, porque “são muito ocupadas. E eu não posso escrever todo o número”.
Convidou um senhor (que se apresentou como sendo licenciado em económicas, “das estatísticas”, no desemprego) a sentar-se e ouviu-o sugerir que o metro chegasse a Monsanto e como é possível viver do jogo na bolsa – “indico-lhe uns livros, se quiser”. Foi abordado por uma síria – sabia o seu nome, Sílvia, mãe de três filhos. Já a tinha recebido. Sabia que o marido de Sílvia não conseguia sair do País e repetiu que nada se poderia fazer enquanto o marido não chegasse à Turquia ou à Grécia. Vendeu duas revistas ao Presidente da Junta, improvisou uma sessão de autógrafos, mais selfies, fez um inquérito aos gémeos Tiago e Hugo, que só queriam uma fotografia com o Presidente. Pagou e seguiu. Vendeu uma CAIS a uns austríacos, falando com eles no alemão que aprendeu no Liceu. Apanhou um jovem “patriota” na esquina, que comprou outra. Foi à farmácia, “a ver se consigo. Sou bom cliente”. Conseguiu. Uma amiga, “minha querida!”, deu-lhe os parabéns pelo primeiro aniversário no cargo. “Um já passou, já só faltam quatro”, disse ele. “Espero que sejam mais nove!”, respondeu ela. E ala. Atravessou a rua. Encheu os pastéis de Belém de flashes. E saiu mais um pedido para se recandidatar no final do primeiro mandato.
Marcelo já o tinha dito e voltara a repetir de manhã, no Pedro Nunes: só no verão de 2020 avaliará. Terá de ver o estado da sua saúde e da sua vida pessoal. Há de pesar a situação do País. O neto Francisco tinha-o feito prometer que só lá ficaria um mandato. Mas na verdade… “se sentir que tenho mesmo um dever de consciência, como há um ano e meio, sou candidato. Se o País estiver numa situação em que há outra hipótese, não sou. Depois, depende da vontade dos portugueses.”
Se não for candidato, vai regressar à faculdade, “dar aulas, fazer conferências, palestras”, não há de escrever memórias nem fazer comentário político (“não devo”), quer passar mais tempo com os netos, com a família e fazer umas viagens (“há quatro ou cinco países que gostaria de visitar e são distantes”, pelo que não os pode deixar para as calendas, porque certas viagens não se podem fazer a partir de certa idade).
O Presidente fala muito do peso dos seus 68 anos. Olha para a frente e vive cada dia ao máximo, porque as únicas coisas de que se arrepende são aquelas que não fez. Segue. Uma senhora acabada de chegar de Gouveia queria uma selfie. Marcelo nunca recusa, mas desta vez acedeu com uma condição: que ela lhe desse dois euros por uma CAIS. Dez passos, mais uma revista vendida, autografada “para a Vera”. O sol estava quente e Marcelo queria umas horas de folga. “Vou ter de vos deixar. Não foi mau”. Terá vendido uns 30 exemplares.
Não quis revelar que marca estaria a deixar para a história, porque “estar à espera de ficar para a história é uma maneira errada de exercer funções”. Mas garantiu que o País está descrispado. E a Assembleia da República, palco de uma acesa troca de palavras entre António Costa e Pedro Passos Coelho, no último debate quinzenal com o primeiro ministro? “A Assembleia não tem drama nenhum”, garantiu, explicando que a situação “faz parte da lógica das coisas” em ano de eleições, a que se seguirão congressos nos principais partidos.
Uma hora depois de ter estacionado o seu carro à porta do Museu da Presidência, Marcelo punha-se de novo ao volante. Seguia para parte incerta. Entre os jornalistas, apostava-se que ia dar o mergulho de que falava desde manhã. Mas a aposta sairia furada… Marcelo preferiria o recato e a frescura dos museus do centro da cidade.