Era janeiro. Do ano de 2014. O inverno ainda não tinha completado o primeiro mês e o País sentia na pele (e nas carteiras) o “enorme aumento de impostos” decretado por Vítor Gaspar, a sobretaxa de IRS, a contribuição extraordinária de solidariedade (CES) nas pensões e os cortes nos ordenados da função pública.
Pedro Passos Coelho, então primeiro-ministro, andava por Aveiro. Na cidade dos moliceiros e dos ovos moles resolveu falar sobre a moção de estratégia que iria apresentar no XXXV Congresso do partido, no mês seguinte. A dois anos das presidenciais, e ainda com eleições europeias e legislativas pelo meio, traçou aquele que seria o perfil presidencial do candidato apoiado pelo PSD. E falou pela negativa e com alvo: o Presidente “deve evitar tornar-se numa espécie de protagonista catalisador de qualquer conjunto de contrapoderes ou num cata-vento de opiniões erráticas em função da mera mediatização gerada em torno do fenómeno político”.
A descrição parecia assentar que nem uma luva a Marcelo Rebelo de Sousa. Vários militantes laranjas confirmaram-no e Marcelo, no seu comentário na TVI, enfiou a carapuça e explicou-se na terceira pessoa: “Claramente, eu acho que ele quis excluir na moção de estratégia o candidato Marcelo Rebelo de Sousa. Quis, o que é perfeitamente legítimo”.
Acrescentou, depois, que “assim, a questão está resolvida”, pois se “o líder do partido fundamental da área diz que é indesejável, uma pessoa de bom senso, a menos que queira fazer um exercício de vingança ou um exercício lúdico, não vai dividir o eleitorado pondo a vitória mais fácil ao candidato do outro lado”.
Afinal, a questão não ficou nada resolvida. As hesitações de Rui Rio, que culminaram num “ficar no seu canto”, abriram alas para o professor mais mediático da televisão. Cinco dias depois das legislativas, com Passos Coelho a tentar formar governo e toda a esquerda em reuniões para inviabilizar o poder da coligação de direita na Assembleia da República, Marcelo sobe ao palco montado na biblioteca de Celorico de Basto e apresenta formalmente a sua candidatura presidencial.
O “cata-vento” tornou-se, assim, inevitável para o PSD e, por arrasto, para o CDS-PP. Ontem à noite, dia 10, os conselhos nacionais dos dois partidos reuniram-se, separadamente, e aprovaram o apoio a Marcelo.
O líder do PSD, Passos Coelho, destacou que o candidato “oferece a perspetiva de equilíbrio político, de fidelidade aos compromissos europeu e atlântico de Portugal e a correta interpretação que faz dos poderes constitucionais do Chefe de Estado”. E fez questão de dizer que o futuro Presidente deve ser, em Belém, “mais árbitro do que jogador”.
Já o presidente do CDS-PP, Paulo Portas, prefere não ver os maiores cargos públicos ocupados pela esquerda. Explicando que já existem um Presidente da Assembleia da República socialista, um primeiro-ministro socialista, um Governo socialista e um presidente da Câmara Municipal de Lisboa socialista, diz que “não há vantagem em acrescentar a esta lista um Presidente da República socialista”.