Qual das duas seguintes situações define o estado de espírito de António Costa? A primeira verificou-se uma destas noites, à saída dos estúdios da SIC, em que, no meio de uma conversa animada com colaboradores e pessoas da estação, o líder da câmara de Lisboa manifestou várias vezes uma confiança inabalável na sua reeleição tranquila, em Outubro. A segunda, porém, revela o autarca em sucessivas reuniões com os responsáveis pelas obras que obrigaram a fechar ao trânsito o Terreiro do Paço, pelo menos até Junho, com o objectivo de garantir que a duração daqueles trabalhos não resvalará para o Outono. Costa receia, afiança quem lhe é próximo, que um tal atraso lhe seja prejudicial.
Talvez o dirigente socialista oscile entre o cool e o ansioso, mas o certo é que, a mais de seis meses das autárquicas, já tem a estratégia a funcionar para ficar mais quatro anos nos Paços do Concelho. E com várias originalidades, sendo, porventura, a mais interessante ter, na sua lista de putativos candidatos, uma série de figuras públicas, para concorrerem a presidentes de juntas de freguesia. Dois exemplos: a ex-jornalista e empresária Catarina Portas e a presidente da Abraço, Margarida Martins, já terão sido sondadas por António Costa para encabeçarem, respectivamente, a corrida à Junta dos Mártires (Chiado) e à de S. Mamede (zona do Rato). Catarina Portas escusa-se a comentar o assunto, não tendo a VISÃO conseguido chegar à fala com a histórica fundadora da Abraço.
Para aquele cargo, habitualmente considerado pouco apetecível pelos nomes sonantes dos partidos, Costa quer também contar com alguns socialistas conhecidos. E já terá conseguido assegurar Sónia Fertuzinhos, deputada, para lutar pela Junta de Alvalade.
MANOBRAS EM CURSO
Tal como os Mártires e S. Mamede, esta é uma freguesia que votou maciçamente no PSD, em 2005, e que, nas intercalares de 2007, foi parar ao pecúlio do PS, fruto da divisão dos votos entre a candidatura laranja de Fernando Negrão e a do independente Carmona Rodrigues.
Explica um dirigente do PS Lisboa: “Um investimento do partido em figuras conhecidas para essas juntas é fulcral para agradar ao eleitorado.” Antevendo-se uma disputa renhida com uma coligação de direita liderada por Santana Lopes, a mesma fonte afirma que nenhuma freguesia pode ser ignorada. Sobretudo as que, historicamente, registam flutuação de voto. E, nestas, já António Costa começou a anunciar obra. Repavimentações das maiores artérias, nomeadamente de ruas da Baixa, e requalificações dos principais espaços verdes de Benfica, S. João (zona de Santa Apolónia) já estão em andamento.
Aos solavancos segue ainda a definição do mosaico de apoios dentro da estrutura de vereadores. A inclusão de José Sá Fernandes que rompeu com o Bloco de Esquerdanas listas socialistas estará assegurada, mas o mesmo não acontece com Helena Roseta, apesar das várias conversas entre ambos. A vereadora já recusou incorporar qualquer lista do PS mas no circulo próximo de Costa acredita-se num entendimento pós-eleitoral.
Mais problemático para António Costa está a ser encontrar um novo vice-presidente, depois de o seu n.° 2, Marcos Perestrello, lhe ter comunicado que não pretende continuar na autarquia. O desagrado por ter visto recair sobre si muita da responsabilidade administrativa e burocrática da câmara, bem como o facto de querer ocupar um lugar no Parlamento ou um posto num eventual novo Governo de Sócrates, fazem de Perestrello uma carta fora do baralho de Costa. Na mira, já está um sucessor: o secretário de Estado da Administração da Justiça, João Tiago Silveira.
Costa e Silveira viajaram, aliás, juntos, de Lisboa para Espinho, aquando do último congresso socialista, mas Silveira ainda não terá dado um “sim” definitivo, uma vez que tem vontade em continuar no Governo. A sua ligação antiga a Costa com quem trabalhou no Ministério da Justiça, no final dos anos 90 faz com que muitos socialistas acreditem não ter Silveira condições para recusar um convite para vice da autarquia.
Também na equipa de vereadores socialistas se adivinham mexidas. Ana Sara Brito, responsável pelo pelouro da Habitação e Acção Social, e Cardoso da Silva, titular das Finanças e Património, deverão abandonar os Paços do Concelho. No primeiro caso, a saída da autarca reflecte o mal-estar sentido dentro do próprio PS com o episódio da casa camarária que Ana Sara Brito ocupou durante 20 anos, numa zona nobre da cidade, a troco de uma modesta renda. Já Cardoso da Silva teve nas mãos o desgastante dossiê (ainda não resolvido) da renegociação da gigantesca dívida do município e fica também ligado àquela que se prevê venha a ser uma das principais promessas não cumpridas deste executivo, a de vender entre 500 e mil casas do património camarário, com vista a encaixar 10 milhões de euros meta que está longe de ser alcançada. “Confirmo a saída de Cardoso da Silva, até porque o próprio tinha posto a condição de só cumprir um mandato. Quanto a tudo o resto, no que respeita a vereadores e juntas de freguesia, ainda é prematuro falar”, diz à VISÃO um assessor de António Costa.
Fosse ou não já se encontrar na antecâmara de uma eleição acesa, o certo é que o líder da autarquia trocou recentemente a sua moradia no concelho de Sintra por um apartamento na Avenida João XXI, em Lisboa. Costa quer estar por perto e não podia ter escolhido sítio mais adverso ou não fosse a zona do Areeiro um dos sólidos bastiões do PSD.