Em abril de 2014, quando a invasão russa da Ucrânia estava na sua primeira fase, Igor Khashin foi a Moscovo na condição de secretário-executivo do Conselho Superior de Compatriotas participar no Congresso Mundial de Compatriotas Russos que Vivem no Estrangeiro. No evento, estiveram presentes outros 20 representantes dos Conselhos Coordenadores dos Compatriotas, além de funcionários do Ministério dos Negócios Estrangeiros e de outras autoridades estatais da Rússia. Khashin está no centro de uma polémica desde que o Expresso noticiou que este cidadão russo recolhia dados de refugiados ucranianos na Câmara de Setúbal.
O discurso de abertura esteve a cargo de Anatoly Makarov, diretor do Departamento de Expatriados do Ministério dos Negócios Estrangeiros, que escolheu a situação na Ucrânia como tema principal, sublinhando que “compatriotas de muitos países do mundo adotaram declarações nas quais apoiaram as medidas tomadas pela Rússia para proteger os direitos e interesses legítimos dos compatriotas russos”.
A palavra foi depois dada ao presidente do Conselho de Coordenação de Compatriotas do Sul da Ucrânia, convidado especial no congresso. Valentin Chernov disse que a Ucrânia se encontrava em “estado de guerra” e que eram necessários mecanismos para proteger os direitos de russos no país – “um plano de ação em caso de emergência”. A Crimeia tinha sido anexada por decreto de Putin no mês anterior e militares russos já haviam entrado no Donbass, para apoiar militarmente o movimento separatista.
Nessa reunião, foi adotada unanimemente uma declaração sobre os eventos na Ucrânia. Nesse documento, subscrito por Igor Khashin, a revolução da Euromaidan foi descrita como um golpe de Estado e louvava-se a intervenção da Rússia na Ucrânia. “Nós, membros do Conselho de Coordenação Mundial de Compatriotas Russos que Vivem no Exterior, observamos com preocupação que, como resultado da tomada inconstitucional do poder em Kiev, a situação dos cidadãos de língua russa da Ucrânia, nossos compatriotas, continua a deteriorar-se rapidamente. Numerosos sinais indicam-nos claramente o crescimento de sentimentos anti-russos, a intensificação de ataques agressivos à língua russa. As celebrações à volta do neonazi Bandera nas ruas das cidades ucranianas não diminui. (…) Expressamos a nossa gratidão à liderança russa pelos esforços que estão a ser feitos na arena internacional para estabilizar a situação na Ucrânia. Estamos firmemente convencidos de que as medidas propostas pela Rússia visam criar condições jurídicas iguais para todos os cidadãos ucranianos, independentemente da sua nacionalidade e língua materna.”
Na sua própria intervenção, Igor Khashin disse querer “estabelecer uma cooperação estreita com os órgãos legislativos da Federação Russa, o Conselho da Federação e a Duma Estatal, para que os compatriotas tenham o direito e a oportunidade de transmitir as suas aspirações e desejos na parte da legislação que lhes diz respeito diretamente”. O imigrante russo em Portugal acrescentou que “foram feitas propostas sobre a possibilidade de atribuir responsáveis a vários ministérios e departamentos russos para coordenar a interação e o contacto constante com compatriotas no exterior”.
No ano seguinte, 2015, em entrevista a uma fundação criada por Sergei Lavrov (o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia), Igor Khashin diria que tinha tido reuniões com vários funcionários da Duma e de diferentes ministérios.
Questionado na SIC, o presidente da Câmara de Setúbal admitiu que não estava em condições de assegurar que as informações recolhidas por Khashin não foram entregues à embaixada da Rússia em Lisboa ou a outros funcionários do Kremlin.