Em 2010 a FIFA escolheu a Rússia para receber o Mundial de Futebol de 2018, numa decisão polémica e que ficou manchada pelas suspeitas de compras de votos. Quatro anos depois, Vladimir Putin orquestrou uma intervenção militar que culminou na anexação da Crimeia. Isso valeu algumas sanções económicas a Moscovo, mas a decisão da FIFA de atribuir ao país a organização da prova mais icónica do futebol mundial manteve-se e o presidente russo recebeu durante esse evento os chefes de estado de algumas potências ocidentais – como Angela Merkel ou Emmanuel Macron – nos camarotes dos estádios.
Receber o Mundial custou cerca de 14 mil milhões de dólares à Rússia. E foi, provavelmente, um dos pontos altos da estratégia de ter uma presença relevante nos desportos mais mediáticos. O futebol tem sido um dos alvos de empresas e oligarcas russos. Roman Abramovich – que obteve recentemente a cidadania portuguesa e é dado como muito próximo de Putin por várias fontes de informação – é dono do Chelsea. Dmitry Rybolovlev é outro dos multimilionários russo com ligações ao futebol. É dono do Monaco e dos belgas do Cercle Brugge. Também o emblema neerlandês Vitesse e o inglês Bournemouth têm donos russos.
UEFA tira final da Champions e COI critica Rússia e Bielorrússia
Além dos investimentos de multimilionários, o futebol europeu tem atraído também o patrocínio de empresas russas. Mas após a guerra iniciada por Putin contra a Ucrânia, sucedem-se os casos de instituições e clubes que se tentam demarcar das ligações à Rússia. A UEFA anunciou que a final da Liga dos Campeões já não se irá realizar na Gazprom Arena em São Petersburgo, transferindo esse jogo para Paris. E decidiu que os clubes russos e ucranianos, assim como as respetivas seleções, disputarão provas da UEFA fora dos dois países.
Já a FIFA ainda não indicou se tomará alguma decisão em relação à presença da Rússia nas suas competições e sobre onde disputará os seus jogos. No final de março, Moscovo receberá um dos playoffs de apuramento para o Mundial que pode incluir, além da seleção russa, as equipas da Polónia, República Checa e Suécia. Estas três federações já indicaram ao organismo máximo do futebol que não contam deslocar-se a solo russo. “Chega de palavras, é hora de agir!”, disse no twitter Cezary Kulesza, presidente da federação polaca, isto depois de o capitão da equipa, Robert Lewandoski já ter afirmado que ia falar com os seus colegas de seleção para tomar uma posição semelhante.
O conselho executivo do Comité Olímpico Internacional exortou todas as federações desportivas a alterarem o local ou a cancelarem os eventos atualmente planeados para a Rússia ou para a Bielorrússia. Pede também que as bandeiras e os hinos dos países não sejam exibidos em eventos desportivos internacionais e critica duramente a Rússia e a Bielorrússia por terem violado a trégua olímpica, que começou sete dias antes dos Olímpicos de inverno, que arrancaram a 4 de fevereiro e termina sete dias depois do fim dos Jogos Paralímpicos de inverno.
Em algumas provas, a bandeira russa já está atualmente suspensa devido às sanções da Agência Mundial Antidoping devido à descoberta de programas de doping sistemáticos no país.
Clubes rasgam contratos com empresas russas, UEFA hesita
Apesar de ter alterado o local da final da Liga dos Campeões, a UEFA não fez qualquer menção ao patrocínio da empresa estatal russa de gás Gazprom, que é um dos principais patrocinadores da entidade que gere o futebol europeu. Isto apesar de pedidos de vários quadrantes para o fazer, incluindo do Parlamento Europeu. A UEFA adianta apenas que irá continuar a “reavaliar a situação jurídica e factual à medida que evolui e a tomar novas decisões caso seja necessário”. O valor que tem sido reportado para esse contrato é de 40 milhões de euros por época.
Alguns canais de televisão com os direitos de transmissão da Liga dos Campeões – como o inglês BT Sport ou o alemão DAZN – sofreram algumas críticas nas redes sociais por continuarem a mostrar os spots publicitários da Gazprom nas transmissões de jogos da competição. No entanto, explicaram, citados pela Bloomberg, que o contrato com a UEFA impõe essa condição. A BT Sport mostrou preocupação com a obrigatoriedade de transmitir esses anúncios devido à intervenção russa na Ucrânia.
Já os alemães do Schalke 04, que envergavam a marca Gazprom nas suas camisolas desde 2006 retiraram o logo da empresa dos seus equipamentos. O último contrato com a gigante do gás foi assinado em 2016 com um valor de 150 milhões de euros por cinco anos e tinha sido prolongado até 2025 no ano passado, o que contemplou também uma redução do valor pago dada a descida de divisão da equipa.
Já o Manchester United cancelou o contrato que tinha com a transportadora aérea russa Aeroflot, que era parceira oficial do clube desde 2013. Em 2017 o contrato de parceria foi renovado por seis anos num valor que terá rondado os 30 milhões de dólares (35,7 milhões de euros). Num comunicado, os red devils justificaram a decisão por partilharem as preocupações dos seus adeptos em todo o mundo com os desenvolvimentos na Ucrânia.
F1 abranda relação com Rússia
A Formula 1 é outra modalidade mediática a abrandar a relação com a Rússia. A Federação Internacional do Automóvel emitiu um comunicado a afirmar que “nas atuais circunstâncias” é impossível realizar o Grande Prémio da Rússia, que estava previsto para setembro deste ano. No entanto, o comunicado não é taxativo sobre se esse evento vai ou não ser cancelado. Alguns pilotos, como Sebastien Vettel, garantiram que não correriam nesse grande prémio caso este se venha a realizar.
A americana Haas, uma das equipas do “Grande Circo”, também retirou dos seus carros o patrocínio da exportadora russa de fertilizantes Urlakali. Essa empresa é detida por Dmitry Mazepin, que é uma das visitas frequentes de Putin no Kremlin. O filho do oligarca, Nikita Mazepin, é um dos pilotos da equipa.
Fora do mundo do desporto, também há eventos mediáticos a querer cortar com a Rússia. A Eurovisão anunciou que não iria incluir nenhuma participação russa este ano, para não levar a um “descrédito” do concurso.