O ataque desta sexta-feira a Salman Rushdie traz à memória uma série de outros atentados contra pessoas ligadas ao livro “Os Versículos Satânicos”, que o escritor britânico de origem indiana publicou em 1988. Considerada uma blasfémia por fiéis do Islão, a obra motivou várias ações violentas dirigidas aos seus tradutores e editores em diferentes países, depois de o ayatollah Ruhollah Khomeini, líder religioso do Irão, ter condenado Rushdie à morte, por decreto (fatwa), em 1989, sentença mais tarde estendida a todos os envolvidos na publicação do livro. A “vingança” custou a vida a quase 40 pessoas e deixou outras a lutar pela sobrevivência.
Com o autor afastado da praça pública, em parte incerta no Reino Unido, protegido por um dispositivo de segurança, a ira dos radicais islâmicos virou-se para outros alvos. Em julho de 1991, o académico japonês Hitoshi Igarashi, 44 anos, foi a primeira vítima mortal das “fatwas”. O tradutor da obra no Japão sofreu múltiplos golpes de faca na face e noutras partes do corpo, no interior do seu gabinete na universidade onde trabalhava. O assassino nunca foi encontrado.
No ano anterior, durante uma conferência de imprensa em que Igarashi e o editor Gianni Palma anunciavam a intenção de publicar o livro traduzido no Japão, escaparam ambos a uma tentativa de agressão por parte de um muçulmano do Paquistão, que acabou detido e deportado.
Uns dias antes da morte de Igarashi, o tradutor de “Os Versículos Satânicos” para italiano, Ettore Capriolo, 61 anos, tinha sido esfaqueado na sua casa em Milão. Sofreu lesões graves no pescoço, no peito e nas mãos, mas resistiu aos ferimentos. O atacante nunca foi identificado e as autoridades italianas descartaram qualquer relação com o livro de Rushdie, apesar de Ettore ter garantido que o agressor era iraniano.
Em outubro de 1993, o alvo foi o editor norueguês William Nygaard, alvejado pelas costas com três disparos, à porta de casa, nos subúrbios de Olso, quando se preparava para entrar no carro. Tinha, então, 50 anos e sobreviveu, depois de vários meses hospitalizado. Quase três décadas decorridas, a investigação ao caso ainda não está encerrada – são suspeitos um cidadão libanês que vivia na Noruega naquela altura e um ex-diplomata da embaixada iraniana no país escandinavo.
Meses antes, também falhou a tentativa de aniquilar o romancista Aziz Nesin, responsável pela tradução de um excerto do livro em turco, mas a estratégia adotada acabaria por provocar a morte de 37 pessoas. Um grupo de 33 pessoas, depois condenadas à morte, ateou fogo ao Hotel Madimak, na Turquia, no qual o escritor estava hospedado. Com 78 anos, ele conseguiu escapar pelas escadas de incêndio, mas as chamas apanharam muitos outros desprevenidos e o resultado foi uma tragédia que vitimou músicos, intelectuais e poetas.