No início de fevereiro, a polémica estava instalada no Japão: Yoshiro Mori, presidente do comité de organização dos Jogos Olímpicos de Tóquio, afirmou publicamente que “uma reunião com várias mulheres vai arrastar-se interminavelmente”, sublinhando que os elementos do sexo feminino falavam demasiado porque “as mulheres têm um sentido de rivalidade forte. Se uma delas levanta a mão para falar, as outras vão todas sentir necessidade de participar também.” Mais tarde, o seu pedido de desculpas para “retirar a declaração” não foi suficiente para acalmar os ânimos e escapar dos seus comentários discriminatórios: a 12 de fevereiro, o antigo primeiro-ministro nipónico demitiu-se das suas funções no comité olímpico.
Ultrapassada esta polémica no Japão, graças ao afastamento de Yoshiro Mori, surgiu depois um novo caso de discriminação de género nas altas cátedras políticas do país. O Partido Liberal Democrático, que esteve quase sempre no poder desde 1955, decidiu convidar mais mulheres para participar nas suas reuniões, uma vez que conta com um número desproporcional de 22 homens num total de 25 membros do seu Conselho Geral. No entanto, foi colocado um entrave a esta “abertura”: nenhuma das mulheres está autorizada a falar nas reuniões, noticiou a Reuters, podendo apenas deixar declarações escritas no final das reuniões.
Esta iniciativa para combater a desigualdade de género e incluir mais mulheres no partido mais poderoso do arquipélago virou-se contra os seus líderes – na sua maioria, homens mais velhos. Depois de apresentar a proposta que visava introduzir cinco mulheres como “observadoras” nas reuniões, Toshihiro Nikay, o Secretário-Geral do partido, de 82 anos, afirmou que esta medida “permitiria às mulheres do Partido Liberal Democrático observar como é que as decisões são tomadas.”
Este anúncio não caiu bem nas redes sociais e entre a oposição política do Japão, refletindo um problema já conhecido no país. De acordo com o mais recente Índice Global de Desigualdade de Género do Fórum Económico Mundial, o Japão encontra-se na posição 121 de um total de 153 países – trata-se do país desenvolvido com a pior classificação na tabela, justificado em particular pela falta de participação das mulheres na economia e na política. Neste momento, apenas 46 dos 465 políticos da Câmara dos Representantes do Japão são mulheres – cerca de 10%, um número bastante inferior à média global de 25%.
A repórter Mariko Oi, da BBC News, no Japão, conta que já se habituou a este “sexismo casual” ao longo dos anos. “Pode acontecer em reuniões, bares ou jantares de família”, diz.”Nesses momentos, muitas de nós apenas riem, fingimos que não ouvimos e seguimos em frente. Foi por isso que os comentários de Mori [ex-presidente do comité olímpico] não me surpreenderam.”
A pressão para combater o problema da desigualdade de género no Japão é cada vez maior para o primeiro-ministro Yoshihide Suga, que tomou posse há apenas 5 meses e cuja taxa de aprovação está cada vez mais baixa. O seu antecessor, Shinzo Abe, defendia uma política de Womenomics, que passava pelo aumento da participação das mulheres da economia – mas os resultados ainda pecam por insuficientes. Segundo ativistas do país, são necessárias mudanças drásticas nos locais de trabalho e na polícia.