É um plano que está a ser atentamente seguido por outros países que também já começaram a vacinar os seus contra a Covid-19. Na maioria dos casos, a prioridade são os profissionais de saúde e os mais idosos, mas não em todos. Em Portugal, por exemplo, a opção foi começar pelos profissionais de saúde e de segurança envolvidos nos cuidados, profissionais e utentes de lares e cuidados continuados e maiores de 50 anos com doenças associadas – e só depois todos os maiores de 65 anos, o que levou, entretanto, a Ordem dos Médicos a insistir na revisão de prioridades para a vacinação. Já a Indonésia, o quarto país mais populoso do mundo, e com mais infetados e mortos provocados pela pandemia no sudeste asiático, optou por outra estratégia. Depois dos trabalhadores da saúde e dos funcionários na linha da frente, os primeiros a ser vacinados serão os adultos em idade ativa.
Um dos argumentos apresentados pelas autoridades de saúde do país, que se preparam para inocular a vacina da Sinovac, desenvolvida pela China, é que não há dados suficientes sobre a eficácia da vacina em pessoas idosas: os ensaios clínicos em curso no país envolvem apenas pessoas com idades compreendidas entre os 18 e os 59 anos.
“Não estamos a contrariar a tendência, estamos a seguir as recomendações dos reguladores de medicamentos do nosso país”, fez questão de sublinhar já Siti Nadia Tarmizi, especialista em saúde e porta-voz do governo indonésio para Covid-19, acrescentando que aguardam ainda informação para decidir sobre a vacinação dos mais velhos.
Argumento de maior peso será o de, ao contrário do Reino Unido, União Europeia e Estados Unidos – que iniciaram a inoculação das suas populações com uma vacina que provou funcionar bem em pessoas de todas as idades, como é o caso da Pfizer/BioNTech – já a Indonésia por ora tem apenas acesso à vacina produzida na China e no país, até agora, chegou apenas o primeiro lote, com cerca de 3 milhões de doses. Quanto às remessas da vacina da Pzifer só deverão chegar a partir do terceiro trimestre, depois ainda da distribuição dos lotes da AstraZeneca e Universidade de Oxford, no segundo trimestre.
Perante este cenário, as opiniões dividem-se. “Penso que ninguém pode afirmar com toda a certeza qual é a abordagem correta”, comentou à Reuters Peter Collingnon, professor de doenças infeciosas da Australian National University, instituição de ensino superior sediada em Camberra, a capital da Austrália. E isto apesar de considerar que a estratégia poderá apenas retardar a propagação da doença – e não reduzir as taxas de mortalidade, que batem todos os recordes na região. “Vamos esperar pelos efeitos que produzirá”, apelou.
Já Dale Fisher, especialista em doenças infeciosas e consultor das autoridades de saúde de Singapura, diz compreender com clareza a lógica da abordagem indonésia. “Os adultos mais jovens são geralmente mais ativos, têm mais contactos sociais e viajam mais, pelo que esta estratégia deverá reduzir a transmissão comunitária mais depressa do que a vacinação dos indivíduos mais velhos”, sublinhou, não deixando, no entanto, de reconhecer que tem riscos. “É claro que os mais velhos têm mais probabilidade de desenvolver doença grave e morrer. Mas vejo mérito em ambas as estratégias de vacinação.”
É a economia…
A verdade é que, ao decidir vacinar primeiro os grupos sociais com mais mobilidade e economicamente ativos, o governo indonésio espera alcançar mais depressa a imunidade de grupo. Segundo disse também Budi Gunadi Sadikin, ministro da saúde do país, será preciso vacinar 181,5 milhões de pessoas, ou cerca de 67% da sua população, para alcançar a imunidade de grupo – e isso requer qualquer coisa como 427 milhões de doses de vacinas, assumindo que todos tomam duas doses e considerando uma taxa de desperdício de 15 por cento.
Mas há também vozes mais céticas quanto a esta estratégia, por considerarem que falta investigação para verificar se as pessoas vacinadas podem ou não transmitir o vírus. “Não se sabe com toda a certeza se estas pessoas não transmitem o SARS CoV-2”, considerou, por seu lado, Hasbullah Thabrany, especialista em Saúde Pública e chefe da Associação Económica da Saúde da Indonésia.
A esperança dos economistas do país, explica ainda a Reuters, é que um programa de vacinação bem-sucedida, ou seja, que abranja qualquer coisa como 100 milhões de pessoas, ajude a relançar a economia – considerando que isso lhes permitirá retomar a atividade económica. Ou como diz Faisal Rachman, um economista do Banco Mandiri, a maior instituição bancária do país, “o grupo etário entre os 18 e os 59 anos tem necessidades de consumo superiores às de outros grupos.” No seu entender, essa será então a forma de acelerar a recuperação económica, porque o consumo interno é o que contribui mais – acima mesmo de 50 por cento – para a economia do país. “E se continuarmos a ter um aumento de casos de Covid-19 isso diminuirá ainda mais a confiança das pessoas”, frisou também, a lembrar que a pandemia empurrou a Indonésia, considerada a maior economia do sudeste asiático, para a sua primeira recessão em mais de duas décadas.
Até ao momento, foram administradas mais de 12,3 milhões de doses em 30 países de acordo com dados atualizados esta segunda-feira, 4, pela Bloomberg. A China segue na frente do processo com perto de 4, 5 milhões de pessoas inoculadas, acompanhada de perto pelos EUA (4,3 milhões). Israel também já anunciou a vacinação de mais de um milhão de pessoas e o Reino Unido cerca de um 900 mil. Na União Europeia, o país com mais vacinados é a Alemanha (238 mil). Portugal, na mesma listagem, ocupa a 12ª posição, com pouco mais de 26 mil pessoas vacinadas, dados de 1 de janeiro. Já em África, a vacinação deverá apenas começar em abril, estimou já John Nkengasong, o diretor do Centro de Controlo e Prevenção de Doenças da União Africana, dada a escassez de vacinas disponiveis a baixo custo e a dificuldade em angariar financiamento para as adquirir.