É nas mãos deste homem que estão os destinos do país mais poderoso do mundo – e consequentemente, em grande medida, do mundo todo.
Sean Conley, que no sábado deu uma estranha conferência de imprensa, repleta de meias palavras e informações que desmentem o que se julgava saber sobre o estado de saúde de Donald Trump, é médico do presidente americano desde 2018. Mas não é um médico convencional. Conley é especialista em medicina osteopática.
A osteopatia é considerada uma medicina alternativa (consta da respetiva lista da Organização Mundial de Saúde). Os seus proponentes acreditam numa abordagem “holística” da saúde humana (um problema de saúde é consequência de desequilíbrios no corpo como um todo), e não na identificação e tratamento dos sintomas e da doença em si.
A manipulação osteopática, central na osteopatia, é um princípio sem qualquer base científica que defende tratamentos de terapia física, através, por exemplo, da aplicação de pressão em ossos e tecidos moles. Há alguma evidência de resultados positivos para dores de costas e pescoço (tal como na fisioterapia), mas na realidade os osteopatas acreditam conseguir curar desta forma doenças não relacionadas com os ossos e os músculos.
Em Portugal, a osteopatia é regida pela lei das medicinas não convencionais, tal como outras terapias não comprovadas cientificamente, como homeopatia, acupuntura, naturopatia e medicina ayurvédica). Ou seja, um especialista nestas terapias alternativas não tem de fazer um curso de medicina.
Nos EUA, no entanto, um especialista em medicina osteopática tem uma formação idêntica à de um médico convencional, ainda que o curso seja ministrado em faculdades próprias – há 14 anos, Sean Conley recebeu o diploma da Faculdade de Medicina Osteopática de Filadélfia. A média de entrada nessas instituições é ligeiramente mais baixa do que nas faculdades de medicina convencional, mas o aumento exponencial de procura por este ramo estará mais relacionado com a crescente popularidade das terapias alternativas em certos nichos da população, no competitivo mercado americano.
A maior diferença para as faculdades de medicina baseada na evidência é que os alunos destes cursos alternativos recebem formação suplementar sobre como os ossos e tecidos influenciam o estado de saúde dos pacientes, estando na génese de doenças tão díspares como asma, pneumonia, dores de cabeça, depressão e cólicas em bebés. Grande parte dos tratamentos são, por isso, baseados em manipulação do corpo com as mãos. Muitos médicos osteopatas prescrevem também outros tratamentos pseudocientíficos, nomeadamente medicamentos homeopáticos.
Não há indicações de que Sean Conley esteja a tratar a Covid de Donald Trump com massagens ou homeopatia. Mas há sinais que revelam que o médico da Casa Branca não segue completamente a linha científica do tratamento da doença. Em maio, Conley revelou que Trump estava a tomar hidroxicloroquina de forma preventiva, apesar de os especialistas alertarem para a sua ineficácia. A Food and Drug Administration, que gere os medicamentos nos EUA, avisa ainda que a hidroxicloroquina pode provocar problemas cardíacos.
O médico, na altura, justificou o tratamento preventivo, dizendo que ele próprio e o presidente concluíram que “os benefícios são maiores do que os riscos”.
Agora que Trump está internado com Covid, pode concluir-se que não funcionou.