O Vietname é um caso de sucesso num mundo em plena pandemia. Para além de apresentar “poucos” casos de infetados – 381 casos no total, a 16 de julho – o país não contabiliza nenhuma morte relacionada com a Covid-19. O primeiro caso confirmado no país surgiu no dia 23 de janeiro e desde esse dia que as autoridades de saúde conseguiram controlar o surto, algo impressionante num país com 97 milhões de habitantes. Para além de ser um país populoso, o Vietname tem ainda um sistema de saúde débil e com uma assistência limitada, mas esta condição não impediu o país de conseguir controlar as cadeias de transmissão ativas e recuperar 90% dos infetados.
Serão estes números e dados demasiado bons para serem verdade? Guy Thwaites, médico de doenças infeciosas, que trabalha num dos principais hospitais que tratam pacientes Covid-19 no Vietname, afirma que os números são reais. “Eu vou às enfermarias todos os dias, conheço os casos e sei que não houve mortes”, relata Thwaites. “Se alguém tivesse uma transmissão comunitária não declarada ou não controlada, veríamos os casos a aumentarem nos nossos hospitais. As pessoas iriam queixar-se com infeções ou dores no peito, talvez não diagnosticadas com Covid-19, e isso nunca aconteceu”, disse.
A experiência com outros vírus, a rápida intervenção, um acompanhamento muito próximo dos infetados e uma comunicação transparente e pública são os fatores apontados como justificação para estes números tão favoráveis.
Em 2003, com a ARS, o país adotou um plano e uma postura que valorizava principalmente a saúde pública, em vez da situação financeira. Com esta atitude, o país começou a relatar com grande transparência as informações que chegavam das autoridades superiores, onde alertavam para os números de mortes e casos confirmados, os riscos que a população corria e quais seriam as consequências. Esta forma de atuar e lidar com a crise resultou com a SARS, com a Síndrome Respiratória do Oriente Médio, o influenza, o sarampo e o dengue, e, aparentemente, voltou a resultar em 2020 com a Covid-19.
Mas este plano só poderia resultar caso existisse uma rápida ação das autoridades de saúde, como aconteceu. Desde que os casos na China começaram a aumentar consideravelmente, o Vietname começou a tomar precauções. No dia 11 de janeiro, um dia de pois das autoridades chinesas relataram a sua primeira morte por Covid-19, o país começou um plano de triagem nos aeroportos e a impor uma quarentena obrigatória para todos os que chegavam de zonas consideradas de risco. Foram convocadas reuniões com as altas autoridades, as escolas foram fechadas e no final de janeiro já existia um plano de contenção para lidar com a pandemia.
Nos meses seguintes, a situação agravou-se e as autoridades vietnamitas suspenderam todos os voos para a China e para outros países de “risco”, a quarentena tornou-se obrigatória para todos os que chegavam do estrangeiro e em meados de março acabaram mesmo por suspender todas as chegadas internacionais. Nas três primeiras semanas de abril a maioria da população ficou confinada em casa, com os negócios não essenciais a encerrarem e um país quase parado.
Pham Quang Thai, vice-diretora do Departamento de Controlo de Infeções do Instituto Nacional de Higiene e Epidemiologia em Hanoi explica o processo de identificação de um infetado e dos seus contactos: um paciente confirmado com coronavírus fornece às autoridades de saúde uma lista de todas as pessoas com quem esteve em contacto nos últimos 14 dias. Os anúncios dessas pessoas são colocados nos jornais e transmitidos na televisão, para informar o público onde e quando é que um paciente com coronavírus esteve.
No início, os testes eram limitados apenas aos indivíduos sintomáticos que podiam ter tido uma exposição recente a um caso confirmado. Agora, a estratégia mudou e são testados todos os indivíduos que estiveram em quarentena, antes e após este período, para além de todos os sintomáticos.
Atualmente, o país esta a lidar com o desconfinamento e parece estar a resultar. As escolas estão abertas desde maio, existe o uso contínuo das máscaras de proteção e o distanciamento social mantêm-se. O país foi abrindo aos poucos e agora pode ser um dos que menos irá sentir uma crise económica devido à sua rápida e agressiva intervenção, o que permitiu voltar à “normalidade” mais cedo do que outros países.
“A população [vietnamita] é muito mais respeitosa com doenças infeciosas do que muitos outros países, ou países talvez mais ricos que não assistem a tantas doenças infecciosas como a Europa, o Reino Unido e os EUA, por exemplo”, explica Pham.”O país entende que estas coisas são sérias e cumprem as orientações do governo sobre como podem impedir que a infeção se espalhe”.