Muitas escolas foram logo fechadas no final de fevereiro, mas algumas reabriram. Os grandes eventos também foram cancelados, embora tenha sido evidente a resistência em adiar os Jogos Olímpicos. Só no final de março, e debaixo de alguma pressão dado que os atletas da maioria dos países não estavam a conseguir treinar, é que a decisão foi anunciada. No final da semana passada, a governadora de Tóquio também revelava muitas reticências à ideia de fechar a cidade: “O máximo que a nossa lei permite é que se recomende um distanciamento social voluntário”, disse Yuriko Koike, a responsável da capital, à Nikkei Asian Review. Além disso, apesar de ter capacidade para fazer 60 mil testes por dia, o Japão fez apenas 14 mil.
Mas agora, que o surto ameaça disparar, o governo quer extremar as medidas. Ao mesmo tempo prepara um pacote de emergência para tentar amenizar o esperado golpe que uma decisão destas tem numa economia que já luta para evitar uma recessão.
Comparando com os outros cenários que nos rodeiam, diga-se que a situação no Japão é bem menos dramática. Pouco mais de 3500 pessoas estão infetadas e há 85 mortes a registar – embora haja quem na região comente que o número limitado de pessoas testadas pode ajudar a explicar valores tão baixos. Só que a partir do momento em que Tóquio ultrapassou os mil casos, disparou também a preocupação geral.
No país sem apertos de mão nem beijos no rosto
Há também quem aponte que os costumes dos japoneses não fomentam propagações destas. Por exemplo, o hábito de curvar-se para cumprimentar pessoas reduz desde logo muito o risco de infeção. Não há apertos de mão nem beijos no rosto. Além disso, desde a primeira infância que a população cumpre disciplinadamente as regras básicas de higiene.
“Lavar as mãos, gargarejar com solução desinfetante e usar máscara fazem parte da nossa vida quotidiana”, explicou à Deutsche Wella uma japonesa mãe de duas crianças. Ou seja, mesmo antes deste coronavírus fazer das suas por terras do sol nascente, já os japoneses consumiam 5,5 mil milhões de máscaras por ano, uma média de 43 por pessoa. “Os japoneses sabem bem que uma infeção pode permanecer sem sintomas, então colocam logo a máscara, a fim de não transmitir o vírus e proteger os outros.”
Perante o relativo sucesso das medidas até agora, o primeiro-ministro, Shinzo Abe, resistiu a declarar estado de emergência. Os japoneses foram mantendo uma vida mais ou menos normal, algumas escolas reabriram, com as crianças sentadas a uma determinada distância umas das outras, em salas ventiladas. Os primeiros parques de diversões também, deixando de fora apenas quem tivesse febre. E as preocupações estavam nos estrangeiros: depois dos sul-coreanos, os cidadãos da União Europeia também passaram a esta impedidos de entrar no país. Só os residentes no Japão podem entrar – mas todos os que vêm da Europa passam a ficar em quarentena durante 14 dias.
Mas as mais recentes informações dizem agora que tudo pode mudar de um dia para ou outro. Shinzo Abe deve anunciar o seu plano de emergência ainda esta segunda-feira, 7, e as medidas, avança a agência noticiosa Kyodo, entram provavelmente em vigor na quarta-feira.
Emergência sim, mas com estímulo à economia
É uma decisão, diga-se ainda, que conta com o apoio público. Segundo a mais recente sondagem, publicada pela Japan News Network, 80% dos entrevistados considera que Abe deverá declará-lo enquanto apenas 12% considera não ser necessário. Kenji Shibuya, prestigiado especialista em Saúde Pública (membro do Programa Global de Evidência para Políticas de Saúde da Organização Mundial de Saúde desde 2011 e atualmente diretor do Instituto de Saúde Pública do King’s College, em Londres, disse já que é tarde demais. “Deveria ter sido declarado até 1º de abril”, salientou, citado pela Reuters.
O esperado agora é que o governo imponha a emergência pelo menos na área metropolitana de Tóquio, e também nas regiões de Osaka E Hyogo, na zona oeste do país – e durante seis meses, avançou o canal japonês de notícias TBS.
O maior receio é que um aumento repentino possa sobrecarregar o sistema médico do Japão. Pelo sim, pelo não, aumentaram as recomendações para quem pudesse começar a trabalhar de casa – sobretudo das maiores empresas japonesas, como a Honda, Toyota e Nissan. No país em que o emprego tem uma prioridade máxima, Abe quer agora que a declaração de uma medida tão drástica como estado de emergência durante seis meses não arrase por completo o que sobra da economia.
Ainda há uma semana, numa manchete do New York Times, a pergunta que se impunha era “será que a economia no Japão poderá ficar ainda pior? Saber-se-á em breve”. A terceira maior economia do mundo, depois de ter sido ultrapassada pela China em 2011, já se sentia aflita com a queda no turismo e a grande esperança eram os Jogos Olímpicos. Em 2013, tinha recebido um recorde de 11,25 milhões de turistas, mas depois o número caiu a pique. Este verão, esperavam-se 20 milhões de visitantes.