Uma das democracias mais jovens do mundo, iniciada, em 2008, por imposição real – e não por exigência popular – o Butão demonstrou nesta quinta-feira, 18, que afinal aprendeu depressa a lição e que está a par dos ventos de mudança que se têm registado em eleições por esse mundo fora: ao serem chamados às urnas, apenas pela terceira vez na sua História, os eleitores penalizaram os dois partidos que dividiram o poder no país na última década, e escolheram para primeiro-ministro o líder de uma organização fundada há apenas cinco anos e sem representação parlamentar.
Lotar Tshering, líder do Druk Nyamrup Tshogpa (DNT), ou Partido da Unidade do Butão, foi o grande vencedor destas eleições, ao conquistar a maioria no parlamento, devendo agora ser nomeado primeiro-ministro pelo rei do Butão.
Médico urologista, muito conhecido no país, nomeadamente pela sua actividade junto das populações rurais mais desfavorecidas, ele conseguiu dominar as duas voltas destas eleições, sempre com um discurso centrado nas questões sociais, no combate ao desemprego e na melhoria dos cuidados de saúde – cujo acesso, tal como a educação, é grátis no Butão.
O seu discurso, mais preocupado com as questões sociais de resolução imediata, representou uma lufada de ar fresco na política butanesa, até agora dominada por dois partidos com propostas mais centradas na economia, em especial nos grandes projetos de construção de barragens para vender eletricidade à vizinha Índia.
Assim, o DNT foi já o partido mais votado na primeira volta das eleições, há três semanas, ditando o afastamento de cena do partido do actual primeiro-ministro, que não conseguiu mais do que um terceiro lugar. O que é uma espécie de sentença de morte política no sistema eleitoral do Butão: o parlamento é formado apenas pelos representantes dos dois partidos mais votados na primeira volta e que, depois, disputam a segunda volta. Aí, quem elege mais deputados forma governo e o outro partido passa a ser a oposição.
Na segunda volta realizada na quinta-feira, 18, o DNT de Lotar Tshering voltou a vencer, conquistando 30 dos 47 círculos uniforminais, garantindo a maioria absoluta no parlamento. O DPT, liderado pelo agrónomo Pema Gyamtsho, e que governou o país entre 2008 e 2013, conseguiu apenas 17 deputados.
Estas foram as terceiras eleições democráticas na história do Butão, um país de apenas 750 mil habitantes, num território equivalente a metade de Portugal continental, e “entalado” entre os dois países mais populosos do mundo, a China e a Índia, na cordilheira dos Himalaias.
Predominantemente budista, o país só se abriu ao mundo na última década do século XX, mas desde então tem prosseguido um caminho de desenvolvimento próprio, centrado no índice de felicidade – por oposição ao económico PIB -, na defesa escrupulosa do meio ambiente – a sua Constituição obriga a que 60% do território esteja coberto de floresta – e num controlo férreo do número de turistas que visitam o país – através de uma taxa diária.
O Butão é também o único país do mundo com uma taxa negativa de carbono – absorve mais emissões de CO2 do que aquelas que emite para a atmosfera – e, segundo as previsões do Banco Asiático de Investimento, deve registar um crescimento económico de 7,1% no próximo ano.
Mas, para os eleitores butaneses, pelos vistos, esse bom desempenho económico, conseguido, nos últimos anos, com os projetos hidroeléctricos com a Índia, não é suficiente. É preciso olhar também para os problemas mais urgentes, nomeadamente equipar com melhores equipamentos os hospitais espalhadas por um território cortado por muitos vales e montanhas. É por aí que, nos próximos cinco anos, passará a felicidade do Butão.
Atualização:
A segunda volta das eleições legislativas tiveram uma taxa de participação de 71,46%, com um total de 313.473 votantes (entre 438.663 inscritos). Votaram nas 865 mesas de voto um total de 199.553 eleitores e foram recebidos 113.920 votos por via postal.
Os resultados finais foram divulgados pela Comissão Eleitoral do Butão “no décimo dia do nono mês do Ano do Cão, correspondendo a 19 de outubro de 2018.