No escritório, a privacidade de um trabalhador quando usa a internet é muito relativa. Mas, ao mesmo tempo, um gestor não pode reduzir a zero a vida social dos seus trabalhadores durante o horário laboral. Com estas duas mensagens, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) inicia a sentença muito aguardada sobre se as empresas violam ou não o artigo 8º – direito ao respeito pela vida privada e familiar – se vigiarem a troca de mensagens dos seus trabalhadores.
A decisão do tribunal de Estrasburgo, por uma maioria de onze juízes contra seis, baliza o conceito de privacidade no emprego e abre a porta a que as empresas vigiem as comunicações de quem lá trabalha desde que haja uma notificação prévia. “O direito ao respeito pela vida privada e à privacidade da correspondência continua a existir, mesmo que possa ser restringido ao necessário”, lê-se na sentença conhecida esta terça-feira (5 de setembro).
No caso concreto, o TEDH contrariou as decisões de tribunais romenos que consideraram “razoável” a monitorização das comunicações, e posterior despedimento com justa causa, de Bogdan Mihai Barbulescu, engenheiro numa empresa privada entre 2004 e 2007. Nesse período, Barbulescu foi instado pela empresa a criar uma conta no Yahoo Messenger para estar em contacto permanente com os clientes. Depois, em julho de 2007, foi confrontado com 45 páginas das comunicações trocadas com o seu irmão e também com a sua noiva, algumas de carácter íntimo. O rasto digital serviu de base ao seu despedimento por violar as regras internas que proíbem o uso de recursos da empresa para fins pessoais.
Barbulescu, depois de levar o caso aos tribunais romenos (que sempre decidiram a favor da empresa), decidiu apelar à instância de Estrasburgo. O TEDH decidiu a seu favor, pela violação do artigo 8º, mas mais pelas falhas encontradas nos processos conduzidos pelos tribunais romenos que pelo caso concreto. “Os tribunais nacionais omitem se determinaram ou não que Barbulescu foi notificado com antecedência da possibilidade do seu empregador poder introduzir medidas de monitorização e qual a natureza dessas medidas”, indica se sentença.
A privacidade dos emails, no local de trabalho, tem sido um tema recorrente no direito laboral. Em tribunal, a maioria dos casos tem sido a favor dos trabalhadores. Agora, o tribunal europeu clarifica que as empresas podem espiar as comunicações electrónicas internas, desde que haja um aviso, e tirar daí consequências que têm de ser proporcionais e proteger os trabalhadores contra a arbitrariedade. GM