Que o PAN sai das europeias com uma estrondosa vitória, ninguém terá dúvidas. O que vai fazer com ela é que é um dos dois grandes mistérios da vida política portuguesa.
Sejamos francos. Ninguém verdadeiramente sabe o que é o PAN. E isso traz uma acrescida responsabilidade aos seus dirigentes na definição de uma agenda para um partido “crescido”. Em teoria, o partido tem um de dois caminhos. O primeiro passa por manter-se na senda de um projeto utópico-radical dedicado a fantasias vegan, centrando o seu programa político nos direitos dos animais. Escusado será dizer que isso condenará o PAN a uma marginalidade política sem grandes consequências. É uma questão de dar tempo aos eleitores para perceberem no que realmente votaram.
Mas o PAN tem à sua frente uma via alternativa. A de perceber que há, em Portugal e na Europa (aliás varrida por uma onda verde), um eleitorado que, não estando disponível para ir viver com gatos tresmalhados para comunas New Age, não deixa de estar seriamente preocupado com as alterações climáticas. Um eleitorado que reclama soluções políticas, económicas e sociais ambiciosas para travar uma catástrofe anunciada. Um eleitorado que vê na transformação necessária dos nossos modelos de produção e consumo não uma desculpa esfarrapada para acabar com o capitalismo, mas uma oportunidade para o colocar numa trajetória de inovação e sustentabilidade. Apontar a esse eleitorado é porventura uma guinada forte demais para o partido. Mas é o único caminho que lhe permitirá alcançar o estatuto com que, por exemplo, terá sonhado a Aliança de Santana Lopes: a de se tornar rapidamente um partido charneira, capaz de viabilizar soluções de governo à esquerda e à direita, trazendo a agenda climática para o centro da governação.
O mais certo, arrisco eu, é que o PAN siga, todavia, o seu instinto radical. E, nesse caso, a questão que se coloca é a de saber quem ocupará este promissor (e importante) espaço político. O PCP perdeu toda a credibilidade nesta frente com a sua longa e inconsequente colonização do PEV. Já o BE, nada preocupado em ser coerente com a sua agenda energética, percebeu rapidamente o valor do filão e não se cansou de defender, na campanha para as europeias, a rápida declaração de um “estado de emergência climática” (fico arrepiado só de juntar na mesma frase “Bloco de Esquerda” e “Estado de Emergência”). E António Costa, que nestas coisas não perde tempo, também já inscreveu o tema nas prioridades para a próxima legislatura.
Sobra a direita. A mesma direita que, justificadamente, preocupa o Presidente da República. A mesma direita que teve, nas europeias, um resultado humilhante. A mesma direita que desesperadamente procura uma nova bandeira, sobretudo desde que o PS lhe roubou o monopólio das contas certas.
Que esta direita se resigne a morrer de pé, que não perceba que tem uma oportunidade de ouro mesmo por baixo do seu nariz, que não perceba que a agenda do clima não tem de ser uma coutada da esquerda, é o segundo grande mistério do momento. Alguém, nesta história, se esqueceu de pensar.
(Artigo de opinião publicado na VISÃO 1370 de 6 de junho)