A banca portuguesa está no centro de todas as atenções. Depois da polémica venda do Banif ao Santander, o BPI é obrigado a diminuir a sua exposição a Angola e a conciliação de interesses entre os seus acionistas espanhóis (CaixaBank) e angolanos (Santoro – Isabel dos Santos) não tem sido nada fácil. O BCP prepara-se para o que aí pode vir, sendo o mais vulnerável a uma OPA. A CGD precisa de capital e o Estado precisa de vender o Novo Banco (depois de ter falhado a primeira tentativa no ano passado).
Prevenindo novas falências no sistema financeiro europeu, o BCE defende uma estratégia de fusões e aquisições tendente a criar grandes bancos regionais. E é neste contexto que se fala da espanholização da banca portuguesa, um termo que indica a aglutinação da banca portuguesa (BPI, BCP e Novo Banco) pelas grandes instituições financeiras espanholas.
“A melhor parte do balanço de um banco é a reputação”
Mas será este o melhor caminho para assegurar uma consolidação do sistema financeiro português? Na opinião de Miguel Cadilhe, economista, ex-banqueiro e ex-ministro das Finanças, a dita espanholização não garante necessariamente uma consolidação do sistema financeiro. Ou não tivesse Espanha sido palco de um dos maiores escândalos financeiros – caso Banesto / Mário Conde – agora reavivados com a detenção, pela segunda vez, do banqueiro espanhol.
“Em alguns casos, as operações bancárias clássicas, a ‘função social’ da banca e a ética do banqueiro cederam passo – lamento imenso – a temeridades, ganâncias, ambições desmesuradas em Bolsa, perdas de escrúpulos, experimentalismos de novíssimas técnicas e instrumentos. A melhor parte do balanço de um banco não está lá, chama-se reputação, quando esta se perde vai todo o balanço atrás”, disse Miguel Cadilhe à VISÃO, numa troca de emails.
Do que precisamos?
Na opinião do ex-ministro, “precisamos de concorrência e de algum regresso às origens”, isto é, “às operações bancárias clássicas, a “função social” da banca e à ética do banqueiro”. Mas também “precisamos de boa regulação e supervisão, submetidas a exigências de eficácia e proporcionalidade”. E, sobretudo, “precisamos de um BCE que perceba tudo isso e trate por igual pequenos e grandes, bancos e países”. E, “precisamos de soberania, relativa, mas soberania”.
Quanto a uma eventual espanholização, se é certo que o sistema financeiro português precisa de capital, não precisará de capital vindo todo da mesma origem. Para Miguel Cadilhe, que se assume como não iberista (no seu sentido político), Portugal não precisa de “concentração”, pois, na sua opinião, no que respeita à dimensão, “as economias de escala não são indefinidamente positivas na banca, pelo contrário, a partir de incerto ponto da escala degeneram em “deseconomias”.
O então ministro das Finanças do governo de Cavaco Silva que ficou conhecido por incentivar o capitalismo popular, numa época em que muitas das poupanças eram aplicadas na compra de ações em bolsa, uma forma de financiar as empresas, pensa que “a grande Política pode e deve procurar evitar que a concentração espanhola ou angolana, ou chinesa, ou a que for, ocorra na titularidade da oferta bancária. A isso se chama poder de persuasão. Tem riscos de abuso ou mau uso de poder? Tem.”